domingo, 27 de junho de 2010

As itaquatiaras


Esta forma de manifestação é comum na região Nordeste. Possui também técnicas laboriosas na produção de outro tipo de grafismos e neste caso, trata-se de uma produção esculpida em suportes rochosos duríssimos (como o granito – rocha metamórfica), o que requer muito empenho e trabalho na obtenção das gravuras. Geralmente, são encontrados nas proximidades de riachos, cachoeiras, arroios e qualquer lugar que tenha sido curso d’água e hoje comumente extinto. 

Se utilizássemos os mesmos critérios de classificação das pinturas podíamos afirmar que esta arte é bastante complexa dentre todas devido à maioria de suas representações serem enquadradas àquilo que é mais difícil de classificar: os grafismos puros. No entanto, pode apresentar também raras figuras antropomorfas e zoomorfas, mais as figuras indefinidas são bastante dominantes nesses painéis.

Existe a suposição de que a maioria dos sítios com Itaquatiaras envolvem de algum modo um culto as águas, contudo não podemos provar tal teoria. Esta ideia se norteia a partir do princípio de que nas regiões de clima semi-árido os locais que, de alguma maneira, forneçam água aos habitantes sedentos são levados a considerar como sendo locais sagrados. Sobre as explicações dessa arte vamos transcrever o que falaram a professora Gabriela Martin da UFPE:

Nos cursos de muitos rios, arroios e torrentes do Brasil existem disseminados de norte a sul, desde o Amazonas ao Rio Grande do Sul, gravuras indígenas realizadas nas rochas das margens e nos leitos dos cursos d’água. São conhecidas pelo nome de itaquatiaras (pedras pintadas, em língua tupi) e que são, de todas as manifestações rupestres pré-históricas do Brasil, aquelas que mais se têm prestado a interpretações fantásticas. Estes petróglifos são de feitura, tamanho e técnica de gravura muito diferentes, dependendo da ampla geografia brasileira. [...] Nessa tradição, típica da região nordestina, predominam grafismos puros, porém deve se registrar a presença de antropomorfos, alguns muito elaborados, inclusive com atributos, como os encontrados na beira do São Francisco, em Petrolândia, PE. Há marcas de pés, lagartos e pássaros em grandes paredões, sempre próximos d’água, e também desenhos muito complexos, que, na imensa solidão dos sertões. Indubitavelmente as itaquatiaras formam a tradição ou as tradições mais enigmáticas de toda arte rupestre do Brasil. Por estarem quase sempre nos cursos d’água e, muitas vezes, em contato com ela, resulta difícil relacioná-las com algum grupo humano, sobretudo pela impossibilidade, na maioria dos casos, de estabelecerem-se associações com restos de cultura material. Entretanto, existem algumas exceções quando as itaquatiaras identificam-se com culturas de caçadores, em abrigos próximos a rios ou em caldeirões. Estes depósitos naturais que se enchem d’água na estação das chuvas, têm, às vezes, as paredes cobertas de petroglifos e tem sido possível realizar-se escavações nas proximidades com bons resultados. É também muito difícil fixar cronologias para esta variedade de arte rupestre. (MARTIN, 2005)

Painel do Sítio Pedra Lavrada de Ingá, PB.

Sem dúvidas, as itaquatiaras do Nordeste do Brasil são os registros rupestres mais enigmáticos e de difícil estudo arqueológico, devido à falta de sedimentos nos locais onde foram gravados os registros, isso estabelece barreiras na prática de prospecção arqueológica de um modo geral.

Provavelmente as itaquatiaras são mais recentes que as pinturas da Tradição Agreste, por serem pouco numerosas em número de figuras, isso levou a acreditar-se que não ultrapassem dois milênios Antes do Presente.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

A tradição Agreste


Supõe-se que os primeiros grafismos denominados de Tradição Agreste surgiram na região Agreste do Estado de Pernambuco e também da Paraíba. São registros rupestres mais toscos, rudes, e em dimensões maiores que a Tradição Nordeste. Na maioria das vezes representam seres estáticos, sem movimento, ou sugerindo pouco movimento.


Composta pela representação de figuras humanas e alguns animais, conta com um número significativo de “grafismos puros” – isto é, aqueles desprovidos de traços que permitem identificá-los com uma representação de nosso universo sensível. Caracteriza-se pelo impacto visual do intenso preenchimento das figuras com corantes vermelhos sendo raras as cenas; as figuras são representadas de forma estática. É originária da região agreste de Pernambuco, sendo suas manifestações mais antigas datadas de 11 mil anos AP. [...] são figuras humanas maiores do que as representadas na tradição Nordeste, não tão bem delineadas e totalmente preenchidas por tinta vermelha escura. (GASPAR, 2003)


Nesta classificação, os antropomorfos apresentam-se de forma isolada, de difícil compreensão, chamados de “grafismos puros”, não tão bem elaborados como na outra tradição. Existem também muitas representações de sáurios (lagartos e répteis) que são animais muito comuns no ambiente semi-árido coberto pela caatinga.
 
[...] a tradição Agreste, caracterizada pela presença de figuras humanas de forma muito típica, raras figuras de animais e um número importante de grafismos puros. São também muito raras as composições representando ações, e as figuras sempre são representadas estáticas. Em alguns casos pode-se ter a impressão de se ver uma representação de uma caçada, mas o único indício visível é a proximidade pictural entre uma figura humana e um animal, não aparecendo gestos ou armas que permitam uma afirmação segura do tipo de ação desenvolvida. [...] a maior concentração de sítios acha-se na região do Agreste do Estado de Pernambuco. Sua existência tem sido até agora datada em 9.000 a. C., tendo uma dispersão muito grande em todo o Nordeste do país. As pesquisas arqueológicas fornecem informações que levaria a pensar que as etnias responsáveis por essa classe de figuras coexistiram com as etnias da Nordeste, sem marcar sua passagem no plano da cultura material. Teriam unicamente deixado os traços de sua identidade nas representações rupestres. (PESSIS; GUIDON, 1992)


Bonecões típicos da Tradição Agreste. Sítio Toca da Entrada do Baixão da Vaca. PI.

Porém, tem-se observado em diversos sítios arqueológicos do Agreste pernambucano que os “autores” de alguns painéis “descartaram” a representação de antropomorfos e zoomorfos, preferindo representar o que Anne-Marie Pessis denomina como grafismos puros que são na verdade círculos, quadrados, retângulos, espirais, linhas sinuosas, em ziguezague, tridáctilos, e outros elementos denominados pela nossa cultura como desenhos geométricos. Jamais saberemos o que possivelmente poderiam representar tais grafismos, visto que nosso mundo sensível e simbólico é muito distinto e recuado no tempo e espaço daquele no qual viveram aquelas etnias pré-históricas.

Outros arqueólogos defendem que as possíveis representações de grafismos puros podem ter sido obtidas através da ingestão de plantas alucinógenas, que são práticas comuns em rituais e cerimônias dos índios contemporâneos. O que mais impressiona é que as representações de grafismos puros são encontradas em sítios arqueológicos de todo o planeta. Obviamente não podemos aceitar a hipótese de que havia um universo simbólico comum a todos os povos pré-históricos dispersos geograficamente, visto que uma representação de um círculo não pode ter o mesmo sentido para várias etnias, vivendo tempos e realidades diferentes.



Na sua versão mais característica, as figuras da Tradição Agreste aparecem isoladas ou formando pequenos conjuntos dominados por uma ou duas grandes figuras antropomorfas (ditas “bonecões”), eventualmente rodeadas por poucos grafismos zoomorfos ou pinturas carimbadas na parede – inclusive impressões de mãos – e conjuntos de pontos. Homens e animais são geralmente desenhados toscamente, mas apresentam detalhes característicos, como a cabeça radiada e pés representados de maneira bastante naturalista (figuras humanas), sendo as articulações do cotovelo e do joelho marcadas por círculos. (PROUS, 2007)


Em toda região Agreste são encontradas muitas pinturas rupestres com maior domínio da Tradição Agreste, provavelmente esta área geográfica apresenta mais sítios por serem descobertos, visto que a região é cortada pelo Planalto da Borborema cortado por bacias hidrográficas importantes e longas, tendo em suas divisas de águas tendentes, vários complexos de serras que se caracteriza por muitos afloramentos rochosos, se prestando, em muitos pontos para acampamentos aos povos pré-históricos. Em quase todas as cidades situadas nessa área definida geograficamente temos sítios arqueológicos com pinturas rupestres: Agrestina, Altinho, Belo Jardim, Bezerros, Bom Jardim, Bonito, Brejo da Madre de Deus, Caruaru, Cupira, Gravatá, Ibirajuba, Jataúba, Jurema, Panelas, Santa Cruz do Capibaribe, São Caetano, Tacaimbó, Taquaritinga do Norte, Toritama, Vertentes, etc. Contudo, as pesquisas nestes locais são preliminares e exigem mais estudos sistemáticos para se compreender melhor o enclave arqueológico desta região.

Em toda região Agreste são encontradas muitas pinturas rupestres com maior domínio da Tradição Agreste, provavelmente esta área geográfica apresenta mais sítios por serem descobertos, visto que a região é cortada pelo Planalto da Borborema cortado por bacias hidrográficas importantes e longas, tendo em suas divisas de águas tendentes, vários complexos de serras que se caracteriza por muitos afloramentos rochosos, se prestando, em muitos pontos para acampamentos aos povos pré-históricos. Em quase todas as cidades situadas nessa área definida geograficamente temos sítios arqueológicos com pinturas rupestres: Agrestina, Altinho, Belo Jardim, Bezerros, Bom Jardim, Bonito, Brejo da Madre de Deus, Caruaru, Cupira, Gravatá, Ibirajuba, Jataúba, Jurema, Panelas, Santa Cruz do Capibaribe, São Caetano, Tacaimbó, Taquaritinga do Norte, Toritama, Vertentes, etc. Contudo, as pesquisas nestes locais são preliminares e exigem mais estudos sistemáticos para se compreender melhor o enclave arqueológico desta região.

terça-feira, 15 de junho de 2010

A tradição Nordeste

A classificação dos registros rupestres em Tradição Nordeste é uma definição criada por Niède Guidon, para aos grafismos característicos da região do Parque Nacional Serra da Capivara, no estado do Piauí. Naquele existem hoje catalogados mais ou menos 370 abrigos sob rocha que foram “decorados” com pinturas e gravuras rupestres por milênios, contudo a concentração de sítios com pinturas são maioria. A nomenclatura Tradição Nordeste foi homenageando a região brasileira, devido à maior concentração de registros rupestres. Porém, aparecem noutras regiões do Brasil os mesmos tipos. Não deixa de ser uma supervalorização dos estudos naquele estado.
São definidas de Nordestes as figuras esquemáticas e emblemáticas de antropomorfos, zoomorfos e fitomorfos que apresentam a ideia de movimento, como se as representações estivessem numa intensa mobilidade.


Cena de uma possível caçada ao tatu. Sítio Boqueirão da Pedra Furada, PI.

A tradição Nordeste foi a mais representada, caracterizando-se pela presença de figuras humanas e de animais, bem como de objetos e plantas. Essas figuras compõem ações que se referem a técnicas de subsistência, atividades cotidianas e cerimoniais. [...] A tradição Nordeste tem a peculiaridade de ser extremamente narrativa, com a representação de diferentes aspectos da vida cotidiana do grupo que a elaborou. As pinturas indicam que caçavam com diversos instrumentos: o veado era perseguido com tacapes, a onça era atacada utilizando-se propulsores e azagaias, o tatu era caçado a mão e abatido com golpes de tacape ou pego pelo rabo. Não existe nenhuma indicação de uso de arco e flechas, [...]. Foram também representados vários ornamentos relacionados com ritos de hierarquia. São cocares e máscaras que aparecem em cenas em que as pessoas estão dançando. (GASPAR, 2003)

Os arqueólogos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM) têm realizado um trabalho sistemático sobre os registros rupestres espalhados pelo Nordeste brasileiro, até o momento todos são unânimes na aceitação de que a Tradição Nordeste representa uma primeira pré-escrita ou forma de comunicação que dá preferência a narratividade das cenas cotidianas dos grupos étnicos que habitaram o Nordeste do Brasil. Outra característica dos registros rupestres encontrados na região Nordeste é a preferência na representação de antropomorfos, no Velho Mundo, por exemplo, a prioridade da arte rupestre são os zoomorfos.


Possíveis representações de cópula sexual. Sítio Boqueirão da Pedra Furada, PI.

A tradição de pintura chamada Nordeste é a mais representada e se caracteriza pela presença, em proporções praticamente iguais, de figuras humanas e animais; as representações de objetos e plantas são menos freqüentes. Os grafismos puros, aqueles desprovidos de traços que permitam identificá-los com uma representação material de nosso universo sensível, são minoritários. O traço marcante da tradição é o fato de que esses grafismos podem estar agenciados, representando ações. Os temas dessas ações podem ser reconhecidos, na maioria dos casos, estando ligados a técnicas de subsistência e atividades cotidianas ou cerimoniais. [...] O apogeu das obras rupestres da tradição Nordeste ocorre por volta de 10 mil anos atrás, coincidindo com o mais alto grau da qualidade técnica da indústria de pedra lascada na região. A evolução do primeiro período se manifesta em uma diversificação temática e em uma complexidade dos agenciamentos na representação de ações. [...] assim, no primeiro período, as representações de atividades de caça comportam duas figuras, o caçador e o animal, e as representações sexuais têm dois parceiros; ao passo que, no apogeu da tradição, esses mesmos temas são representados com a participação de um maior número de pessoas. (PESSIS; GUIDON, 1992)


Para a comunidade científica do sul do país, sobretudo, de Minas Gerais e São Paulo, a antiguidade dos grafismos da Tradição Nordeste são muito questionadas devido a sua datação ser muito remota em comparação com as demais tradições que são encontradas no interior do Brasil. Porém, sobre a representatividade e funcionalidade dos grafismos rupestres desta tradição são consensuais.


Cervídeos em movimento, provavelmente sendo caçados visto que os antropomorfos estão carregando propulsores. Sítio Toca do Pajaú, PI.

Encontram-se cenas de sexo (cópula em várias posições, masturbação), de execução, de caça e de rituais ao redor de uma árvore. Algumas dessas cenas estão sendo interpretadas por alguns pesquisadores à luz dos rituais dos atuais índios Fulnió: a árvore poderia ser a Jurema, que fornece uma substância alucinógena; as cenas de “masturbação” seriam, na verdade, flagelação ritual do pênis com uma planta urticante etc. As representações zoomorfas incluem um grande número de emas e de cervídeos, isolados ou correndo em bando; em alguns abrigos aparecem porcos-do-mato, quatis e até caranguejos de água doce. A tradição Nordeste estendeu-se num vasto território que vai do sul do Piauí até o Mato Grosso, passando por Goiás, infiltrando-se tardiamente me parte do território mineiro. A oeste, chega até o pé dos Andes – na Bolívia, no Peru e na Colômbia Meridional. (PROUS, 2007)


A região Amazônica apresenta muitos registros rupestres, contudo, as pesquisas naquela região ainda são preliminares e estão no início, visto que a região da Amazônia compreende a maior área geográfica do país.
Admite-se que as primeiras manifestações da Tradição Nordeste iniciaram-se por volta de 12.000 anos antes do presente e pararam de ser representadas por volta de 7 – 6.000 anos atrás. Com a interrupção dos registros rupestres da Tradição Nordeste surge às primeiras manifestações da Tradição Agreste.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

O povoamento da América do Sul


Antes de falar sobre o que indica o título acima, precisamos voltar ainda ao assunto das discórdias entre os arqueólogos dos EUA e da América do Sul. Vejamos: o principal questionamento de diversos arqueólogos sul-americanos é sobre a limitação do tempo imposto pelo Sítio Clóvis.
Porém, novas descobertas arqueológicas noutras regiões, principalmente na América do Sul, sugerem que os sítios de cultura Clóvis não foram os pioneiros na ocupação do continente americano.
Esses novos achados foram obtidos pelos arqueólogos denominados de pré-clovistas, ou pré-Clóvis. Vale salientar que os pares pré-clóvis não formam uma corrente homogênea, existem arqueólogos que defendem que o povoamento das Américas é anterior a cultura Clóvis em no máximo 2 mil anos, neste caso a ocupação do continente se situaria não em 11 e 12, mas entre 13 a 14 mil anos atrás. Ademais há outros pré-clovistas que recuam bastante a colonização do continente em até 50 mil anos. Não obstante, os norte-americanos são relutantes em aceitar os dados arqueológicos e tampouco as datações obtidas por carbono 14, criticando as evidências e teorias apresentadas, contestando-as como dados inconclusivos, “contaminações” de solo, área de escavação deturpada entre outras acusações desmedidas. Para Meggers (1979) nenhum dos achados relacionados a datas que excederam 24.000 anos têm sido universamente aceitos pelos arqueólogos.

Clovistas ferrenhos recusam-se até mesmo a examinar com seriedade qualquer possibilidade de que poderia ter havido humanos no continente americano antes dos fatídicos 11,4 mil anos que marcam o início da cultura Clóvis na América do Norte. (NEVES, 2008).

Todavia, novos achados arqueológicos obtidos pela corrente pré-clóvis tem acalentado ainda mais o debate sobre o povoamento das Américas. Segundo Betty Meggers (1979) Em Tlapacoya, México, instrumentos lascados associados com a fauna extinta foram datados pelo Carbono – 14 entre 24.000 ± 500[1] e 22.000 ± 2.600 anos passados.
Como já afirmamos, muitos arqueólogos sul-americanos aventaram a possibilidade de povoamento do Novo Mundo por travessia marítima. Vejamos o que falam os pesquisadores, a partir dos resultados obtidos com as datações e novas análises em fotos de satélites, além do uso de tecnologias avançadas.
A arqueóloga brasileira Niède Guidon (que está a serviço do Centro de Altos Estudos da Sorbone) defende que o homem navega a mais de 800 mil anos, o que segundo ela, seria admissível que o homem chegou às Américas por navegação via oceano Pacífico. A pesquisadora se baseia na ocupação da Ilha de Flores, na Indonésia.
Porém, o pesquisador da USP Walter Neves refuta tal teoria utilizando-se como fundamento a ausência de sítios arqueológicos e vestígios de ocupação nas Ilhas Polinésias. Ainda Segundo Walter, as datações destas ilhas não chegam a 4 mil anos, o que inviabiliza a teoria a ocupação de uma datação tão antiga. Mas, achados arqueológicos na Austrália comprovam a existência da presença humana naquele país a pelo menos 50 mil anos o que possibilita a teoria do povoamento das Américas por técnicas de navegação plausível. É notório que só se aporta na Austrália, naqueles tempos, por travessia marítima.
A tese da professora Niède Guidon, neste caso, não pode ser descartada.
Porém, para corroborar com os questionamentos, alguns arqueólogos, inclusive norte-americanos, que realizaram descobertas de sítios arqueológicos na América do Sul com datações anteriores a cultura Clóvis.
Para a arqueóloga norte-americana Ana Roosevelt a ocupação do continente americano foi realizada unicamente por Bering e sua dispersão no sentido Norte/Sul. Ela conclui, [...] assentaram-se primeiramente nos planaltos Norte Americanos (há cerca de 11.500 anos) [...] chegaram aos Andes por volta de 10.500 anos AP. [...] a colonização completa até o extremo da América do Sul foi datada em torno de 10 mil anos atrás.
Na floresta amazônica, Anna Roosevelt fez uma descoberta que abalou a comunidade científica norte-americana, o abrigo sob rocha pedra pintada, localizado nas imediações de Monte Alegre/PA, apresentou o seguinte quadro:

Foram feitas 56 datações radiocarbônicas a partir de restos de vegetais carbonizados, revelando uma antiguidade entre 11.200 e 10 mil anos atrás e 13 datações de termoluminescência em líticos e sedimentos, que indicaram uma idade pertencente ao pleistoceno tardio, contemporânea dos paleoíndios norte-americanos. (ROOSEVELT, 2000)

Essas evidências põem ainda mais em dúvida o modelo de ocupação Clóvis. Se os primeiros americanos entraram unicamente pelo Estreito de Bering porque existem sítios arqueológicos na América Central e América do Sul com datações em muito mais recuadas que a cultura Clóvis?
André Prous, (2000) arqueólogo da UFMG fez descobertas valiosíssimas na região de Minas Gerais, contudo ele é prudente em aceitar datações anteriores há 12 mil anos. Ainda segundo Prous, embora tenha sido encontrado um instrumento de pedra, que pela datação associada, obteve 20 mil anos a 15 mil anos no Sítio da Lapa Vermelha, este achado isolado para ele, como todos os outros indícios datados de mais de 12 mil anos no Brasil, é de difícil interpretação. Prous segue a mesma linha de raciocínio da Escola Americana, apesar dele ser Francês, ele descartou a datação devido a uma amostra de instrumento lítico encontrada sem correlação com outras evidências de cultura material que comprovassem a antiguidade do artefato. André Prous (2000) continua: A presença humana em Minas Gerais (e no Brasil) só é claramente atestada a partir de um período datado entre 11 mil e 12 mil anos atrás.
Outro sítio pré-histórico que desperta a revisão da teoria Clóvis é o de Monte Verde, no Sul do Chile, cuja datação é de 12.500 anos Antes do Presente.
 Segundo Anne-Marie Pessis (2000) [...] Monte Verde permite afirmar que grupos humanos habitavam essa região há 33 mil anos.
Para Walter Neves (2008) [...] o homem estava mesmo presente em Monte Verde havia pelo menos 12,3 mil anos.
No entanto, os pré-clovistas não são consensuais, embora as datações de um mesmo sítio assegurem seqüências estratigráficas confiáveis alguns arqueólogos são comedidos em datações muito recuadas. Monte Verde, no Chile, fica localizado nas proximidades de um riacho, foi escavado pelo arqueólogo norte-americano Dilehay (o maior crítico das pesquisas de Niède Guidon, na Serra da Capivara/PI), e as suas pesquisas encontraram diversos vestígios de uma cultura material muito distinta da cultura Clóvis, o que reforça a hipótese de diversas e sucessivas ocupações pleistocênicas do continente Americano.
Outro sítio localizado na região centro-oeste do Brasil põe em crise a teoria Clóvis, trata-se do sítio Santa Elina, localizado a 100 quilômetros ao noroeste de Cuiabá, capital do Estado do Mato Grosso. Santa Elina é um abrigo sob rocha próximo a Serra das Araras, nas coordenadas geográficas 15° 27’ 175” de latitude Sul e 56° 46’ 915” de longitude Oeste. Tem milhares de vestígios de sucessivas ocupações pré-históricas em milhares de anos. O sítio foi descoberto na década de 1980 e começou a ser escavado por uma equipe de Arqueólogos franceses liderados pelo casal Águeda Vilhena Vialou e Denis Vialou em 1984, e desde então foram mais de 15 anos de escavações que renderam muitas descobertas. A equipe de arqueólogos fez sucessivas escavações numa área total de 40 metros de comprimento e 5 metros de profundidade demonstrando que a ocupação do abrigo a partir de 3,50 m é do período pleistocênico.

Nesse espaço estreito de “moradia”, Santa Elina oferece condições bastante favoráveis a instalações duradouras: abrigo com proteção total das intempéries, razão pela qual, vestígios de fauna e de flora ficaram tão bem conservados, proximidade de fonte de água e posição estratégica importante, dominando o vale, o que é notável tanto para o conforto da habitação como para a subsistência do grupo pela facilidade de espreitar a caça.
Oito mil peças foram recolhidas e inventariadas. Correspondem em sua grande maioria ao material lítico, pedras lascadas no intuito de fabrico de utensílios ou plaquetas de hematita para a confecção de bastões e pigmentos para corantes. Alguns outros vestígios estão presentes, como os adornos vegetais, mas não chegam a ter uma representatividade importante em relação ao lítico. Foram também inventariados numerosos restos faunísticos, cuja grande parte corresponde a mais de 9 mil osteodermos da preguiça-terrícola ou gigante, megafauna extinta, presença essa bastante excepcional em sítios pré-históricos. (VIALOU, 2005).
                                                                                   
Santa Elina tem causado muita polêmica na comunidade científica devido a suas datações, a cronoestratigrafia que demonstrou seqüências de níveis arqueológicos não contaminados, tampouco, alterados estratigraficamente, porém na camada de 5 metros de profundidade obteve-se uma datação de 30 mil anos Antes do Presente. Contudo nesta camada não foi encontrada nenhuma evidência de vestígios materiais antrópicos. Neste mesmo sítio foram encontrados fósseis de megafauna, sobretudo, de uma preguiça-terrícola Glossotherium associados a refugos (vestígios diversos de lítico) de origem humana. Um achado tem colocado Santa Elina na lista dos sítios arqueológicos mais antigos das Américas, pedaços de pele óssea, talhados como pingente.

Um dos osteodermos[2] foi transformado em adorno pelo homem que morou ou passou pelo abrigo deixando como testemunhos de suas atividades uma centena de lascas e dezenas de utensílios em calcário e em sílex. Não só é fundamental a constatação da contemporaneidade do homem com essa fauna extinta, num solo datado em torno de 25 mil anos, como sua convivência com a preguiça gigante num mesmo espaço habitacional e sua intervenção, que permitem transformar um de seus milhares de ossículos em um pingente, por abrasões nas duas faces desse osso de 2,2 cm de comprimento e de orifícios simetricamente opostos em suas extremidades. (VIALOU, 2005).

Outros indícios são indicadores da presença contemporânea no sítio de megafauna com seres humanos, restos de instrumentos líticos, ósseos e carvões confirmam a seqüência estratigráfica sem nenhuma alteração no solo. Todos estes indicadores foram datados por métodos convencionais, como o carbono 14.
O sítio arqueológico mais polêmico da atualidade é sem dúvida o Boqueirão da Pedra Furada que fica na área do Parque Nacional Serra da Capivara, no sudoeste do Piauí. Único parque de proteção do semi-árido com vegetação de caatinga. O Parque Nacional Serra da Capivara possui uma área de 130 mil hectares e compreende os municípios de São Raimundo Nonato, Coronel José Dias, São João do Piauí e Canto do Buriti. Possui a maior concentração de espécies animais do clima semi-árido.
Além disso, a região do Parque dispõe de três conjuntos geomorfológicos: a oeste, as chapadas; a leste, planícies e no centro as cuestas. Estas formas de relevo forneceram milhares de abrigos sob rocha ao homem pré-histórico, atenuando o acesso a reservatórios d’água naturais. A caatinga é o bioma dominante em toda a área do Parque Nacional, contudo, nas áreas mais baixas das chapadas onde correm pequenos riachos e ainda existem árvores mais altas que são resquícios do clima tropical-úmido do passado. Supõe-se que a 50 mil anos toda a área do Parque Nacional era ocupada por vegetações típicas de clima tropical-úmido e as planícies era uma extensa savana. A fauna era composta por mastodontes, preguiças e tatus gigantes. Que as evidências arqueológicas corroboram a contemporaneidade com o homem pré-histórico. Acredita-se que a transição do clima de tropical-úmido para um clima mais árido ocorreu por volta de 12 mil anos atrás, as fontes de águas se tornaram mais raras, promovendo supostamente a extinção dos animais de grande porte (megafauna). Contudo, os animais de pequeno porte e os humanos se adaptaram melhor as alterações climáticas.
Segundo os estudos feitos por várias equipes da Fundação do Homem Americano e que podemos encontrar nas referências aqui apresentadas, pode-se afirmar que a região do Parque Nacional é composta de rochas sedimentares que foram se formando a partir da sedimentação do oceano que antes formava o relevo da região. O arenito e calcário são mais comuns, apesar de possuírem a mesma formação geológica são bem distintos. O arenito foi formado a mais de 400 milhões de anos e é composto com grãos de quartzo, mais apresenta também uma fração de óxido de ferro, que foi gerado pela impregnação de águas das chuvas. A paisagem do Parque é formada por serras, chapadas, boqueirões e baixões que foram moldadas pelas ações do vento, chuvas, sol, calor e frio (os intemperismos).

A toca do Boqueirão da Pedra Furada forma um abrigo sob-rocha de grandes dimensões, com 75 metros de altura aproximadamente e, uma largura de 70 metros, aberto ao sul, situado no sopé de cuesta arenítica e em frente à planície pré-cambriana. As paredes do abrigo estão cobertas de pinturas pertencentes a períodos diferentes das tradições Nordeste e Agreste que totalizam mais de mil grafismos, mas que significam apenas os restos de painéis rupestres que deviam ser muito superiores em número de registros gráficos. Além da ampla plataforma, que permite o assentamento de um expressivo número de indivíduos, o abrigo apresenta, no lado esquerdo, um boqueirão que recebe diretamente a água da chuva que escorre por uma chaminé escavada na rocha, e que pode armazenar aproximadamente 7.000 litros d’água. (MARTIN, 2005).

O sítio arqueológico Boqueirão da Pedra Furada apresenta a maior concentração de pinturas rupestres do mundo, alguns painéis com pinturas caíram do bloco original no solo do abrigo junto de fogueiras que foram datadas por carbono – 14 em 17 mil anos antes do presente, contudo, nas camadas inferiores alguns artefatos líticos associados a fogueiras apresentam as datações mais antigas das Américas, entre 39 mil a 48 mil anos Antes do Presente.
Essas descobertas foram apresentadas como tese de Doutorado pelo arqueólogo italiano Fábio Parenti em 1993 na capital francesa. Fábio defendeu que os artefatos líticos encontrados nas camadas inferiores do sítio são indubitavelmente instrumentos de origem antrópica. Os instrumentos líticos foram confeccionados em pequenos seixos de quartzo e quartzito, matérias-primas exógenas, visto que o abrigo é de arenito, ele conclui que não há como questionar que estes artefatos foram trazidos de outros lugares pelos agrupamentos pré-históricos que habitaram aquele abrigo há 50 mil anos atrás. O Boqueirão da Pedra Furada foi escavado entre os períodos de 1978 a 1998, 20 anos de estudos.
Em 1982, duas datações de 25 mil anos foram obtidas de amostras retiradas de níveis arqueológicos, estimulando ainda mais a prospecção de uma área mais profunda. Dois anos mais tarde num nível sedimentar mais baixo foram obtidas mais datações em torno de 31 mil anos atrás. Em 1987 em camadas estratigráficas mais baixas ainda foi confirmada a seqüência cronoestratigráfica de várias amostras datadas em 39 mil anos. Noutra camada de sedimentos foi obtida uma datação de 50 mil anos. O sítio proporcionou uma seqüência de datações de 6 mil anos à 48 mil anos Antes do Presente.
A cronoestratigrafia confirma as sucessivas ocupações do sítio, porém, para os Clovistas as datações são suspeitas, até mesmo as amostras que foram defendidas por Fábio Parenti em seu Doutorado são postas em dúvidas se realmente possuem origem antrópica. Contudo, Niède rebate as críticas de alguns arqueólogos (as), sobretudo norte-americanos, refutando a possibilidade daquela fogueira ter sido acesa por um incêndio natural, ela continua: se tivesse ocorrido um incêndio de origem natural naquele abrigo o mesmo seria estendido para todo o abrigo e não apenas para um aglomerado de seixo ordenados deliberadamente por seres humanos.
O “embate científico” parece não ter fim. As evidências arqueológicas encontradas em diversos sítios da América Central e do Sul suscitam a construção e aceitação de novos modelos de ocupação do Continente Americano, às evidências são claras, as datações foram obtidas pelos mesmos laboratórios que dataram a cultura Clóvis. Ou todos os arqueólogos que fizeram descobertas de habitações pleistocênicas estão errados ou o modelo Clóvis está superado.
Como proposta da dispersão humana aqui na América do Sul, a pesquisadora Niède e responsável pelo projeto, apresenta uma migração para o Brasil, que ainda precisa ser confirmada. Ao mesmo, não tem respostas para dizer de onde vieram os grupos humanos que habitaram o sudeste do Piauí.

Considerando-se que até um metro abaixo de camada datada de 48 mil anos ainda havia material arqueológico, pode-se afirmar que a área arqueológica de São Raimundo Nonato foi ocupada pelo homem desde há cerca de 60 mil anos. [...] Em síntese pode-se admitir que, penetrando no país por uma via ainda desconhecida, grupos humanos chegaram até o sudeste do Piauí há cerca de 60 mil anos. O sul de Minas Gerais estaria povoado por volta de 30 mil anos atrás, e no sul do Brasil grupos humanos estariam estabelecidos há pelo menos 15 mil anos. (GUIDON, 1992).


[1] Significa a margem de erro: assim a data pode ser 500 anos para ou para menos. Diante do número 24 mil, 500 é considerado insignificante, mas 2.600 para 22 mil anos é considerada alta a margem de erro.
[2] Relativo aos animais que tem a pela dura, em forma de placas ósseas.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Teorias e controvérsias sobre o povoamento das Américas


Ainda hoje não existe um consenso acerca do povoamento das Américas. Arqueólogos norte-americanos e sul-americanos, há mais de uma década, promovem acirradas contendas sobre diversas teorias de ocupações desse continente. Os grandes centros de estudos arqueológicos da Europa e da América Latina, também se dividem entre os dois lados, havendo uma forte tendência para aceitar as provas apresentadas pelos sul-americanos.
A chegada do homem pelo Estreito de Bering: esta teoria migratória é aceita por todas as academias, que tem como princípio o período da última Glaciação. A questão é o determinismo dos norte-americanos que se apegam somente no modelo Clóvis fist. Por isso, determinam que a ocupação das planícies da América do Norte, por seres humanos, se deu por volta de 11.400 anos BP[1], que foi a datação obtida dos achados do sítio Clóvis. Os norte-americanos acreditam que tal travessia só foi possível em no máximo 20 mil anos atrás. Assim sendo, as ocupações de outra parte da América estariam limitadas por esta data, supondo ser ela a mais antiga do continente.
Os arqueólogos sul-americanos, mesmo aceitando a mesma teoria, têm levantado outras datas bem mais recuadas daquela de 11.400 para a entrada na América por aquele estreito. A partir dos vestígios achados e das datações obtidas em suas pesquisas, estes sustentam que o processo de dispersão dos grupos humanos em direção ao Centro e ao Sul do continente, aconteceu provavelmente em períodos bem mais recuados. Hoje, o intervalo de tempo é bem diferente daquele: se sustenta deste os 48 mil, até 14 mil anos Antes do Presente.
Assim sendo, achamos ser necessário mostrar um pouco o que a literatura sobre o assunto apresenta, através da fala dos pesquisadores que argumentam esta questão, dando suas versões sempre a partir dos resultados de suas pesquisas. Por exemplo, Betty Meggers (1979) acha que os primeiros homens tenham chegado a América há 12.000 ou há 40.000 anos. O fato é que o homem entrou no Novo Mundo enquanto estava, técnica e culturalmente falando, ainda subsistindo à base de plantas e de animais selvagens.
Com a ampliação das pesquisas a arqueóloga Anna Roosevelt (2000) afirma que a cultura mais antiga dos sítios de matança, foi datada por escavação de dez sítios onde foram obtidas datações radiocarbônicas entre 11.200 e 10.900 anos. Estes sítios estão próximos a localidade de Clóvis, no Estado do Novo México, nos Estados Unidos. A cultura daquele grupo foi caracterizada como especializada na caçada a animais de grande porte[2], promovendo ações de caça ordenada e matança generalizada. Outra característica dessa cultura é sua indústria lítica bem elaborada destacando-se as pontas de projéteis com acaneluras. Isto significa que este povo utilizava encabamento de seus projéteis o que facilitava a matança de grandes animais.
Esta hipótese sugere que a colonização do continente foi impulsionada pela questão de sobrevivência. A nossa interpretação sobre as ideias de Meggers, sugere que mesmo sendo o ser humano o único animal capaz de prover objetos à sua sobrevivência, fica difícil entender porque ele correu os riscos de seguir manadas de animais que eram extremamente perigosos de serem caçados? Se pensarmos na rusticidade de suas “armas”. Para reforçar a nossa dúvida, queremos ilustrar com o texto abaixo:

A gama de modelos permitida pela capacidade do cérebro do homo sapiens é tal que parece frustrante continuarmos fechados dentro da solução única de um bando correndo atrás da caça através de toda a Beríngia e do Alasca à Terra do Fogo. (GUIDON, 1992)

Outro embate “científico” é desencadeado pela via de acesso ao continente americano. Os arqueólogos norte-americanos são unânimes e resistentes ao defender que a chegada se deu exclusivamente pelo Estreito de Bering. Existe outra teoria migratória que afirma, que em um período bem mais recente (entre 4 e 2 mil BP), grandes levas humanas chegaram navegando a América Central e do Sul pelo Oceano Pacífico, vindos do extremo oriente. Esta ideia é compartilhada por todos, mas está fora daquela discussão por ter sido há pouco tempo e explica porque dos índios têm forte característica mongólica por serem, de fato, descendentes dos grupos étnicos dos povos orientais. 
Como se explica a passagem para a América pelo Estreito de Bering se geograficamente o estreito é um obstáculo natural? Porque se admite que durante a Glaciação duas situações opostas, do ponto de vista climático estaria ocorrendo: intensas geadas no hemisfério norte onde o gelo ocupava todo estreito, formando uma espécie de “ponte” interligando a Sibéria (Ásia) ao Alasca (América). Para Meggers (1979) a mais antiga “ponte de gelo” existiu entre 50.000 e 40.000 anos atrás e foi usada por várias espécies de mamíferos do Velho Mundo. Se os animais, para fugir do frio buscavam um local mais quente onde pudessem encontrar alimento, caminharam a esmo até alcançar um pouco mais o sul da América do Norte e o homem pode ter acompanhado.
O segundo fenômeno aconteceu nas regiões tropicais da Terra. Pelos choques térmicos entre as camadas atmosféricas havia a evaporação das águas, que tomava o caminho do norte e transformavam-se em nevascas já que a tendência climática da Terra era a queda de temperatura. Tal situação pode ter determinado o rebaixamento dos níveis dos mares que recuaram em mais de 150 metros dos níveis atuais. Cada glaciação durou milhares de anos, de forma que quanto mais água saia dos mares se transformando em grande geleiras, diminua o nível das águas dos oceanos.
Vamos imaginar que as águas estando 150 metros abaixo, a lógica indica que milhares de ilhas, que hoje estão submersas, passaram a existir e formavam uma “trilha natural”, ligando, por exemplo o continente africano e a América do Sul. Por isso, não devemos ver como estranho alguns arqueólogos, em sua maioria, sul-americanos discutindo e sugerindo a possibilidade de travessias por diversas partes, dando acesso ao continente americano em quase toda sua extensão, principalmente nas proximidades do Equador e assim se explicam os achados de vestígios humanos com datações tão antigas no Brasil. As pesquisas arqueológicas na América do Sul têm proporcionado evidências de que a chegada ao continente não se restringe apenas a uma leva humana apenas pelo Estreito de Bering. Provas de tal travessia ainda não foram descobertas ou pode ter sido destruídas e/ou continuam submersas pelo avanço dos mares ao nível atual. 
                          
Ao longo da última glaciação (Wisconsin), a retenção das águas nas grandes geleiras continentais fez baixar o nível global dos oceanos em cerca de 120 metros abaixo do nível atual, deixando emersas amplas superfícies antes submersas. (LIMA, 2006)

Esta hipótese refuta a travessia pela Beríngia como única passagem utilizada pelos primeiros grupos humanos, a ausência de sítios arqueológicos correspondentes a esses primeiros moradores, no leste da Sibéria e no oeste do Canadá, aumenta as dúvidas. Esta ausência de vestígios materiais da travessia por Bering deixa muitos arqueólogos sem dados plausíveis que confirmem uma datação confiável para a passagem. As descobertas arqueológicas até o momento não corroboram a passagem pela Beríngia no período do pleistoceno[3] Os sítios que foram descobertos no leste siberiano e no noroeste canadense foram datados do holoceno,[4] isso significa que pode se tratar de deslocamentos de povos recentes, vindos das bandas do centro dos respectivos continentes.

Contudo, as evidências arqueológicas do lado leste de Beríngia são decepcionantes para os que esperam dela grandes antiguidades. Os registros são pobres, insuficientes, e nem um pouco convincentes no que diz respeito a ocupações anteriores há 12 mil anos. [...] Broken Mammoth, que apresenta evidências consistentes aliadas a datações confiáveis que o posicionam até o momento como a ocupação mais antiga do Alaska, em torno de 11.700 anos antes do presente. [...] Atualmente, os sítios mais antigos a oeste de Beríngia, como Ushki e Berelekh, estão datados entre 14 mil e 11 mil anos antes do presente. (LIMA, 2006).


[1] BP = Before Present, expressão usada a partir de 1950. Encontramos também na versão em português, pela iniciais AP = Antes do Presente.
[2] Segundo Walter Alves Neves, animais de grande porte são aqueles com mais de 44 kg.
[3] É o período correspondente entre 1,8 milhões de anos e mais ou menos há 12 mil anos atrás.
[4] Período correspondente entre 12 mil anos até hoje.


segunda-feira, 7 de junho de 2010

Desenho encontrado na Austrália pode ser o mais antigo do mundo

Um antigo desenho indígena de dois pássaros extintos há 40 mil anos pode ser um dos mais antigos do mundo, afirmam cientistas australianos.

Um antigo desenho indígena de dois pássaros extintos há 40 mil anos pode ser um dos mais antigos do mundo, afirmam cientistas australianos.



Arqueólogos acreditam que a pintura rupestre descoberta em um remoto planalto no Território do Norte, na Austrália, pode ter 40 mil anos de idade.

A pintura mostra dois pássaros gigantes que parecem um genyornis, um tipo de ave não voadora que habitou a Austrália e que, se acredita, teria sido extinta com o aparecimento do homem.

Se o desenho tiver sido produzido quando esta fauna ainda existia, como alguns especialistas acreditam, ele seria um dos desenhos rupestres mais antigos já encontrados.
Em tinta de cor ocre, a pintura foi descoberta sob uma prateleira de pedra sabão em Arnhem Land, ao leste de Darwin, onde a tradição artística indígena começou há milhares de anos.

A recente descoberta foi examinada pelo arqueólogo Ben Gunn, que afirma que, se a idade de 40 mil anos for confirmada, será um fato monumental.

“Se for confirmada ela terá pelo menos o dobro da idade de qualquer outra pintura rupestre cuja idade já tentou se identificar na Austrália”, disse ele.

“Então, o grau de sobrevivência desta pintura seria enorme se comparada à maioria das obras de arte indígenas já classificadas.”

O remoto local será escavado cuidadosamente e testado para que os cientistas tentem estabelecer a idade da pintura.

Ainda há dúvidas, entre especialistas, se a pintura sobreviveria tanto tempo nas duras condições tropicais do norte da Austrália.

Os arqueólogos, no entanto, se sentem energizados pela descoberta, afirma o correspondente da BBC em Sydney, Phil Mercer. Eles acreditam que possa haver centenas de milhares de pinturas rupestres aborígenes ainda espalhadas e não descobertas pela Austrália.

Fonte: BBC Brasil