quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Consumir para existir


Final de ano as coisas sempre se repetem. As tradições permanecem inalteradas. As famílias brasileiras, por exemplo, buscam prazeres supérfluos mediante a compra de inúmeros presentes que teoricamente oferecerão felicidade aos seus entes queridos. O período natalino juntamente com o réveillon são as datas mais esperadas e comemoradas pela maioria dos habitantes do nosso planeta e também pelo comércio e indústria, todavia, muitas pessoas não percebem os interesses obscuros, latentes e gananciosos de várias empresas capitalistas que estendem seu poderio manipulador de mentes e costumes através dos meios de comunicação. Nestas datas o comércio fica em júbilo mediante o apetite de milhares de consumidores eufóricos de todas as idades, em busca de comprar e gastar bastante dinheiro, cujo objetivo é auferir uma maior autoestima pessoal, familiar e profissional. Trabalhadores assalariados, funcionários públicos, bancários, todas as classes sociais buscam saciar sua sede sagaz por presentes nestas datas efêmeras. Tais pessoas acreditam que o simples fato de presentear os amigos, familiares e cônjuges irá satisfazer e valorizar ainda mais as relações pessoais e profissionais. Isso é um equívoco induzido pelo sistema capitalista. 

O capitalismo alimenta o espírito das pessoas através de ilusões e falsas sensações de prazer e felicidade que supostamente podem ser obtidas por meio da aquisição de inúmeros bens materiais. As coisas, objetos, presentes (bens de consumo) tornam-se instrumentos indispensáveis para a consolidação da felicidade dos seres humanos. Pode-se inferir que o paradigma de felicidade só pode ser obtido mediante a compra de vários bens materiais, essa é a ideologia defendida pelos capitalistas. Essa falsa sensação de bem-estar disseminada pelo capitalismo esconde interesses pecuniários de seus idealizadores. Como o sistema capitalista consegue tal proeza de induzir os seres humanos a consumir bens de consumo sem uma reflexão?  Através de sua maior força, a mídia. Os meios de comunicação conseguem transmitir os valores capitalistas sob a forma de milhares de propagandas diárias e repetitivas que invadem as mentes humanas tornando os seres humanos em meros reprodutores e consumidores de produtos e bens de consumo. O modelo de felicidade impelido pelo capitalismo consiste na ideia de quantos mais bens materiais você puder dispor mais feliz será, noutras palavras, se no seu natal não houver Peru Sadia... 

Frei Betto escreveu algo parecido:

Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é  o resultado da soma de prazeres: “Se tomar este refrigerante, vestir este  tênis,­ usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!” O problema é  que, em geral, não se chega!

                No mês de dezembro o 13º salário praticamente não é destinado a causas mais salutares ao assalariado, em geral, o bônus salarial fica disperso pelo comércio mais próximo a sua residência. Quem possui sapatos tem a necessidade de comprar mais modelos, pois a tendência – moda – determina e impõe que você deve trocar os calçados, sua geladeira não lhe serve mais, pois, o ideal são aquelas nas quais tira-se água diretamente da porta, o fogão de quatro bocas deve ser substituído por um de seis, caso já exista o de seis, deve-se trocar por um de inox, seu celular que antes era de um chip está ultrapassado, a tecnologia proporcionou o de dois chips e, agora não serve mais, pois já existe o com três chips! Os computadores devem ser trocados com bastante frequência, visto que os ideais são os portadores do processador i3 da Intel. Seu automóvel ficou velho, vamos comprar um novo, pois o vizinho é mais feliz, tem em sua garagem um carro mais novo que o seu. Só neste ano, a título de exemplo, apesar das iniciativas e favorecimento do governo na redução do IPI, foram vendidos 3,5 milhões de automóveis, quase a metade da população do Uruguai. Natal e réveillon as pessoas devem passar de roupas novas, caso contrário, o ano vindouro pode-se tornar um péssimo agouro. Além de tudo isso, para se ter um excelente final de ano é preciso o consumo de muita bebida alcoólica, caso contrário, a festa não será animada e proveitosa.

                Em geral, o que há em comum a todos os comportamentos acima mencionados sobre diversas posturas dos seres humanos? O ato de não pensar no que fazem sem pensar! Karl Marx, em 1844 já alertava: “o valor que cada um possui aos olhos do outro é o valor de seus respectivos bens. Portanto, em si o homem não tem valor para nós”. Os bens materiais que hodiernamente são consumidos em todo o mundo ganharam status de seres vivos, pois o valor simbólico atribuído a diversos objetos como celulares, computadores, carros, casas, roupas, calçados e etc., possuem mais valores que os demais seres humanos. Façam um teste pessoal, na sensação de prazer e bem-estar quando se entra num supermercado, shopping Center ou qualquer loja física ou virtual para consumir ou até mesmo contemplar os nossos desejos e sonhos de consumo. É uma sensação de devaneio, idílica, nos sentimos, comumente, extasiados e felizes momentaneamente. Contudo, quando saímos de tais recintos, constatamos que a felicidade se esvaiu. É essa a ilusão que o capitalismo apetece nos seres humanos. Somos destinados a consumir para uma existência humana mais prazerosa e requintada. A maioria dos seres humanos são acarretados pelos sentimentos de frustração e impotência, quando não possuem a capacidade econômica e social de consumir os bens materiais tão desejados. As pessoas, atualmente, estão adoecendo com mais frequência, estresse, depressão e a síndrome do comprador compulsivo são as patologias psicológicas mais fomentados pelo capitalismo, cujo sistema propõe que sua felicidade está ao lado das coisas, dos bens materiais, caso contrário, é um impotente. Por isso, as pessoas entram na criminalidade, jamais houve na história da humanidade tantos índices de violência e furtos ocasionados de morte, o latrocínio. O que é mais importante é uma carteira repleta de dinheiro ou um celular do que a vida do portador! É mais interessante ser rico do que possuir inteligência. 
Hoje, não importa o seu nível de conhecimentos, de ler com frequência, de priorizar a busca pelo desconhecido, o que é mais importante é a quantidade de bens materiais que se dispõe. Para confirmar tais assertivas, vamos pensar no ocorre, em geral, com as pessoas: quando você sai para alguma festa ou evento, a primeira preocupação que se tem é como sair vestido, com quais roupas e sapatos, isso só ocorre pelo receio da reação das demais pessoas ao lhe verem vestido. O atendimento dispensado a uma pessoa que chega de automóvel a qualquer evento é diferente do que chega de ônibus ou após uma longa caminhada. Vejam as reações dos vendedores das lojas quando entramos para consumir, estampam sorrisos, caso não compremos nada, os vendedores mudam de humor instantaneamente. Tudo isso são a teias do capitalismo.
                Um fato é inegável, apesar dos diversos desejos de feliz ano novo que com frequência ouvimos, em geral, as pessoas entram no mês de janeiro sempre endividadas. As despesas realizadas no período natalino sempre chegam ao mês seguinte com a exigência de pagamento. Caso não sejam saldadas, vem os transtornos com os serviços de proteção ao crédito.
                O que desejo mostrar é o nível social e econômico criado a partir de interesses meramente pecuniários das grandes empresas multinacionais que tornam os valores éticos e morais extintos enquanto enaltecem que o modelo ideal de cidadão é aquele no qual podemos comprar, gastar e consumir com bastante ânsia, caso não estejamos nesse patamar, somos impelidos pelo mesmo sistema a habitar cada vez mais os espaços marginais da sociedade, a periferia econômica e social.