quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Cuide bem dos mestres!


Muitos economistas apontam o Brasil como um dos países emergentes economicamente e politicamente, não há dúvida disso, hoje o nosso país é uma potência mundial. Está entre as dez maiores potências do mundo. A crise econômica que neste ano afetou e até mesmo ruiu milhares de países que dependem do setor industrial e econômico, aqui, apenas aqueceu a economia brasileira. O nosso país com quase duas centenas de milhões de habitantes não está entre os primeiros do ranking mundial devido à ausência de políticas sociais. Economicamente falando, o Brasil desponta, no cenário social falta ainda muita coisa para tornar uma grande nação. Saúde pública, saneamento, segurança, infra-estrutura, moradia, rodovias, qualidade de vida e a mais importante de todas, a Educação, precisam emergencialmente de novas ações e políticas públicas. A educação no nosso país está precária, faltam ações políticas de valorização do Magistério. Apesar da Constituição Federal de 1988 enaltecer que uma das obrigações do Governo é fornecer uma Educação digna de qualidade. Na verdade não é isso que acontece. Ser Professor num país que não valoriza o magistério está sendo uma tarefa bastante difícil. Há décadas atrás um professor recebia mensalmente mais de três salários míninos em média, hoje o valor de uma hora aula não ultrapassa R$ 4,00. A qualidade do ensino público decaiu vertiginosamente, assim também como a valorização dos docentes é fútil.

Além desses índices negativos, o respeito aos mestres está declinando cada vez mais, porque isso ocorre no país que cresce economicamente e padece de políticas educativas? Segundo o Senador Cristovam Buarque, uma das ações primordiais para o crescimento de uma nação ou país é a educação. Essa asserção se cristaliza a partir da análise dos países que estão na dianteira como países desenvolvidos, a educação nestes países é uma prioridade. No nosso caso a Educação fica ao relento. Se a falta de ações políticas e a desvalorização do Magistério fossem os únicos fatores responsáveis pelo descrédito nas Escolas Públicas seria admissível, todavia, o desrespeito aos mestres está em ascensão. Viraram prática comum os professores de escolas públicas serem agredidos. Alguns anos atrás, a maior agressão desferida por alguns alunos aos professores era a agressão moral, através de ofensas e palavras encolerizadas. Comumente, ouve-se nos diversos meios de comunicação de massa que professores são agredidos fisicamente em todos os lugares do país, estes fatos suscitam um questionamento, qual o mal causado pelo ato de ensinar? Ensinar é difundir de alguma maneira a prática de desvelar o conhecimento, apreender quer dizer pegar os ensinamentos que são transmitidos pelos nossos mestres. Já se foi o tempo que o professor era reverenciado, aclamado, aplaudido, ovacionado, a prática apologética aos docentes está cada vez mais sendo esquecida. O que está acontecendo no cenário social que muitos alunos não respeitam seus mestres? Será que a sociedade, principalmente, sob a instituição da família está perdendo os valores mais pertinentes ao respeito? Respeitar é uma manifestação de consideração ao outro ser, também é uma forma de reconhecimento pela atuação profissional ou pessoal daquele ser, contudo, respeitar o próximo está sendo dirimido por alguns jovens alunos, porém, vale salientar que a prática de desrespeito não é comum a todos os discentes.


Tenho conversado com professores de várias regiões do Estado de Pernambuco, e desconheço algum docente que não tenha sofrido alguma agressão física ou moral proferida por alunos.

A situação é preocupante, houve casos de professores que foram baleados, esfaqueados, bofeteados em algumas partes do corpo e até mesmo assassinados quando saiam de seu local de trabalho. A impunidade, muitas vezes, impera de forma majestosa num país que cresce economicamente e recrudesce socialmente, principalmente educacionalmente. Os pais quando comparecem à Escola para atendimento de chamados de desvio de conduta de seus filhos, muitas vezes, mal ouvem o posicionamento dos professores, enaltecendo e defendendo a versão – muitas vezes distorcidas – dos filhos, nesses casos o “errado” é o professor. Ocorreram casos que os agressores foram os próprios pais! O que há de errado com a nossa educação pública? O bode expiatório hodierno é o professor. Se o ensino vai mal o responsável por tal fracasso é o docente. Se o aluno é evadido do ano letivo, onde estava o professor no momento da evasão do aluno. Se o aluno fracassar no desempenho escolar, o culpado é professor. Será que o responsável pelo índice de reprovação, evasão e desrespeito encadeados pelos alunos é do professor? Onde fica a atuação dos políticos e da família nesses casos?

Vamos aos dados:

No Estado de Pernambuco os docentes recebem os piores salários do nosso país, um professor Estadual recebe em média R$ 980,00, dados fornecidos pelo Ministério da Educação (MEC – 2009). Inclusive estes dados estão equivocados, um professor estadual em início de carreira recebe apenas pouco mais de R$ 800,00. As salas de aulas estão superlotadas, em média 50 ou mais alunos por sala. É muito difícil administrar ou mesmo lecionar nestas condições de trabalho. Imagine-se um professor com 14 turmas de mais de 50 alunos, são mais de 700 alunos para repassar ensinamentos e lições. Evidentemente, não há como fornecer um ensino de qualidade em tais condições. A maioria das Escolas públicas do Estado de Pernambuco não dispõe de laboratório de informática, laboratório de ciências, sala de projeção, projetores – conhecidos popularmente como data show – professores efetivos, bibliotecas com acervos limitados e carência de profissionais de diversas funções. Quando dispõe a infra-estrutura é inadequada. Outro dado negativo, parte dos próprios alunos que possuem livros didáticos, que são os mesmos adotados em algumas escolas privadas, mas, muitas vezes, não o levam para as aulas ou até mesmo nem utilizam para fins didáticos.

Estas são apenas algumas evidências da situação das Escolas Públicas do Estado de Pernambuco. Ser professor num país que não valoriza o magistério está sendo um ofício cada vez mais escasso. Os docentes que resistem são aqueles intrépidos profissionais que enfrentam com destreza os desafios da profissão. O que me surpreende é que o ofício de professor é semear os alunos com ensinamentos, lições, conhecimentos e não promover o ensino do inadequado, prescindível ou mesmo de coisas nocivas aos estudantes.

Para encerrar, em alguns países asiáticos os alunos aguardam os professores sentados dentro das salas de aulas, não interrompem o decorrer do ensino, não viram as costas para os docentes, muito menos atrapalham a atenção dos demais alunos. Quando um aluno fracassa no ano letivo escolar, no Japão, por exemplo, a família é a responsável por tal fracasso!

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Beber um pouco de filosofia é salutar

No mundo dominado pela ciência, técnica – filha da ciência – novas tecnologias, globalização e dinheiro é bastante comum várias pessoas valorizarem coisas inúteis e prescindíveis que não servem para a sociedade, de uma maneira geral. As pessoas estão sendo influenciadas peremptoriamente pelas mídias e outros meios de comunicação de massa que são aparatos reprodutores de ideologias de grandes multinacionais monopolistas, onde a verdadeira relevância do indivíduo consiste no seu potencial de consumo. Muitas pessoas não sabem, mas estão sendo manipuladas de forma inconsciente pela mídia e globalização. Isso pode parecer estranho, mas merece uma análise em dados plausíveis e verossímeis de nossa sociedade. Minha preocupação é fundamentada, principalmente, pela juventude que está sendo facilmente “moldada” pela TV e outras mídias. Perscrutando os estudantes das Escolas públicas e privadas percebe-se que a concepção de valor dos jovens brasileiros está atualmente bastante afetada. É freqüente ouvir nas salas de aulas os estudantes “preocupados” com os participantes de reality shows, como por exemplo, Big Brother Brasil ou A Fazenda, programas que não fornecem contribuição alguma, extasiados ainda com o itinerário e enredo das telenovelas, acompanham diariamente a vida de “famosos” ou “estrelas” como se auto-denominam e a importância prioritária, a educação e a perspectiva de vislumbrar o futuro, fica no plano secundário ou até mesmo terciário. Os adolescentes estão consumindo cada vez mais álcool, cigarros e outras drogas que afetam o desempenho mental e escolar. E não sabem desses riscos.

Mas, para que serve então a filosofia diante de todos estes fatos corriqueiros?


Os seres humanos, de modo geral, perderam a capacidade de se admirar com os acontecimentos banais, comuns e cotidianos. Para a maioria dos brasileiros os acontecimentos diários são normais e não há nada de errado na sociedade. Tudo vai bem! Em outras palavras, as pessoas estão se tornando todos “iguais”, apesar das diferenças culturais e geográficas. Os brasileiros – apesar do hibridismo cultural – estão se transformando em meros seres passivos e reprodutores de outros “valores” que são vendidos diariamente e assimilados de forma inconsciente a partir dos meios de comunicação. A filosofia se torna necessária e importante, neste caso, devido a sua insistência de explicação dos fatos e fenômenos ocorridos naquela sociedade. Conhecer o funcionamento dos fenômenos e acontecimentos naturais ou antrópicos é um dos interesses da filosofia e para conhecer algo é preciso delimitar um objeto que deseja ser conhecido. A curiosidade faz parte do instinto humano, assim também como a consciência define as ações e práticas humanas, contudo, na sociedade dominada pela ciência, novas tecnologias, globalização e capitalismo as pessoas estão perdendo a capacidade de se “admirar” e sensibilizar-se com as coisas mais banais. Do ponto de vista filosófico essa atitude reproducionista é perigosa e nociva aos humanos. Nós humanos recorremos a um “instrumento” que os demais animais do planeta não dispõem, a consciência. Essa capacidade de articular pensamentos torna os seres humanos soberbos no planeta Terra, mas na sociedade contemporânea algumas pessoas estão perdendo essa capacidade intrínseca humana. Pensar utilizando à lógica e a razão são meios imprescindíveis aos humanos, neste caso, a filosofia se torna utilitária porque fornece subsídios para uma compreensão da própria natureza humana.


O domínio pujante da internet, Orkut, MSN, twitter só reforça a supremacia das novas tecnologias em detrimento da cultura e valores humanos. Os jovens estão se tornando mais dependentes de tais plataformas virtuais e “esquecem” de conhecer o mundo no qual vivem. As pessoas estão perdendo essa postura de investigar o que ainda não foi explicado de forma plausível e satisfatória, tampouco se questionam sobre a natureza da verdade. O que interessa ao verdadeiro filósofo é a incapacidade de se acostumar com a realidade a sua volta. Para o filósofo, nada é comum, verdadeiro e indiscutível, o real e virtual não se confundem. O que importa é a postura de vê o que os outros não conseguem enxergar. Todavia, aqueles que não priorizam o hábito de ler, escrever, estudar, pesquisar, debater são facilmente influenciados pelas ideologias impositivas do capitalismo. Os brasileiros lêem em média dois livros anuais, bem abaixo dos americanos, cinco livros; e dos europeus, oito livros anuais. Isso corrobora e facilita a imposição de valores desnecessários que são imbuídos – principalmente – na juventude, que é mais facilmente penetrável.


Muitas vezes fico divagando em meus pensamentos sob as atitudes de alguns jovens que ficam priorizando festas de várias naturezas em detrimento de seu crescimento intelectual. O que é mais importante: delinear o futuro, seguir uma profissão ou curtir tênues e efêmeros momentos festivos que não contribuem em nada para a natureza humana. Platão há 24 séculos condenava as pessoas que valorizavam os “prazeres” em detrimento do enriquecimento cultural e filosófico. Platão tinha razão, qual a contribuição de se beber em demasia? Fumar cigarros amentolados? Se preocupar com a vida de pessoas teoricamente famosas que ganham milhares de salários mínimos, reforçando a má distribuição de renda no Brasil? Qual a relevância de reality shows que mostram apenas pessoas confinadas dentro de uma casa ou “curral”?


Beber filosofia pode evitar todos estes males mencionados acima. Não conheço pessoas que se dedicaram a estudar e desvelar conhecimentos que não obtiveram sucesso em suas vidas. Quando me refiro a sucesso não estou enaltecendo a valorização de aquisição de bens materiais, mas pertinente a realização profissional e pessoal. Os brasileiros, de modo geral, precisam ter “abertura” para visibilizar a sociedade na qual vivem e não simplesmente ser meros consumidores de valores culturais imbuídos pela globalização e o capitalismo. Para ser filósofo não é necessário cursar um curso superior, muito menos se submeter a aulas de filosofia, para desenvolver a prática filosófica cabe ao ser humano estimular a capacidade de se “espantar” com as coisas ou fenômenos mais comuns da sociedade.


Filosofia não faz mal, viver no mundo imerso no desconhecimento pode ser letal.

sábado, 10 de outubro de 2009

O grande macaco


Existem muitos questionamentos acerca da espécie humana, o principal e mais instigante deles é quem somos nós? De onde viemos? Quem criou o universo? Qual o destino da humanidade? Mas, existem também várias respostas e diversas teorias. A teoria do Criacionismo, por exemplo, defende que os seres humanos são na verdade uma criação divina, essa explicação se apóia na Bíblia de Judeus e Cristãos. No Evolucionismo, o ser humano passou por mudanças físicas e biológicas ao longo de milênios ou mesmo de milhões de anos, neste caso, evoluir significa transformar-se e não aprimorar como algumas pessoas imaginam. Existe a teoria do Big Bang (grande explosão) na qual o universo surgiu a partir de uma grande explosão, surgindo assim, o cosmos, nosso sistema solar e a vida no planeta terra. Para alguns biólogos, a vida no planeta pode ter surgido a partir de bactérias oriundas de outros planetas, transportadas por meteoritos. Alguns povos indígenas têm uma explicação própria fundamentada nos mitos sobre a origem da natureza, da vida e de suas divindades, cada povo indígena possui seus mitos sobre a origem do que se conhece como “mundo”. As ciências humanas, principalmente Antropologia, Arqueologia e História seguem a teoria do evolucionismo, de Charles Darwin, Naturalista Britânico. Esta teoria encontra-se no livro A origem das espécies de 1859. Segundo Darwin, as espécies se submetem a processos de mudanças físicas e biológicas gerando outras espécies ou novas espécies de seres vivos. Isso Darwin chamou de Seleção Natural. Muitos religiosos condenam a tese de Darwin, contudo com vistas da ciência e da razão é a teoria mais plausível que se conhece até o momento. Para Charles, os indivíduos mais aptos de cada espécie são os genitores ou promotores de novas linhagens de indivíduos mais seguros e fortes para enfrentar o ambiente no qual vivem. Várias ciências admitem a consistência da teoria de Darwin, porém isso não acontece com a religião, que vê essa teoria como uma heresia ao produto da criação divina.
Voltando a questão humana, principalmente sob a ótica da Antropologia, Arqueologia e História é bastante comum observar em alguns livros a teoria de que o homem vem ou descende do macaco, mas segundo André Langaney, geneticista do Museu do Homem de Paris, o homem é um macaco. Muitos manuais e livros de história alegam que o homem evoluiu do macaco, isso não é verdade. Homem e macaco são variações genéticas de um mesmo ancestral, em outras palavras, existiu uma espécie há cerca de 7 milhões de anos ou mais que promoveu o surgimento da espécie humana e dos macacos. Essa teoria é corroborada pela genética e outras ciências que analisaram os genes de humanos de várias regiões do nosso planeta comparando com o de chimpanzés, por exemplo, e o resultado 99% de semelhança entre as duas espécies. Todavia, mesmo assim algumas pessoas são relutantes em aceitar tais pesquisas e evidências, isso pode ser explicado pela variabilidade de formas de conhecimentos existentes, para alguns, nós humanos somos produtos da vontade divina, da fusão de bactérias, da criação espontânea do universo e a mais segura de todas até o momento, somos o resultado de um longo processo evolutivo até concluir no gênero homo sapiens sapiens. Por conseguinte, esta pesquisa que conclui que humanos e primatas são parentes muito próximos merece credibilidade? Charles Darwin poderia ser taxado de herege por promover uma explicação científica para as origens das espécies? Esses questionamentos suscitaram polêmicas no meio acadêmico e científico quando publicadas. Portanto, o debate permanece aberto para aqueles que possuem destreza e flexibilidade em analisar as diversas explicações existentes até o momento.  

O futuro da humanidade ainda é incerto, assim também como a própria origem da humanidade. O que se sabe até o momento sobre o gênero humano ainda é bastante preliminar e inconclusivo, porém, com os avanços tecnológicos e surgimento de novas ciências fica mais evidente e contundente a teoria nas quais seres humanos e macacos são parentes muito próximos, até que se prove o contrário.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Lagoa Santa – um apêndice sobre o povoamento das Américas

O município de Lagoa Santa fica localizado a pouco mais de 40 km de Belo Horizonte, no Estado de Minas Gerais, de nome simples e até desconhecido da maioria dos Brasileiros, mas para a comunidade científica, principalmente arqueólogos e paleontólogos, é uma região rica em vestígios materiais e imateriais dos primeiros americanos. A região que compreende a cidade de Lagoa Santa, assim como os municípios de Pedro Leopoldo, Matozinhos, Prudente de Morais, Vespasiano, Funilândia e Confins são repletos de serras e maciços rochosos, denominados localmente de carste. O carste de Lagoa Santa, como foi definido as formações rochosas locais são ricas em vestígios de cultura antrópica remotíssima e refugos de fósseis de animais extintos, principalmente megafauna. Vale ressaltar que nesta região existem mais de quinhentas cavernas catalogadas até o momento, não obstante, o carste é um cenário de uma vegetação exuberante e mista de cerrado, florestas, matas decíduas e semidecíduas, estas últimas são floras semelhantes à caatinga nordestina. Na primeira metade do século XIX, Lagoa Santa recebeu a visita do naturalista e paleontólogo Dinamarquês Peter Lund (1801 – 1880). Segundo alguns biógrafos de Lund o motivo de sua vinda ao Brasil foi devido a problemas de saúde, Lund estava muito vulnerável ao clima temperado e frio da Dinamarca. Sendo assim, Peter Lund veio para a região dos trópicos para estabilizar e restabelecer sua saúde. Todavia, Lund era um intrépido aventureiro e amante de arqueologia e paleontologia, não poderia deixar de conhecer a região do carste de Lagoa Santa. Lund fez incursões e prospecções nas cavernas de Lagoa Santa em meados da primeira metade do século XIX. No início foi muito difícil, não se achava vestígios nem artefatos, mas depois de algum tempo seu trabalho foi recompensado com a descoberta de fósseis de seres humanos e animais. Mais tarde sua descoberta tornou-se impar em toda comunidade científica mundial, Lund havia descoberto numa camada de sedimentos o que era inimaginável no século XIX, a possibilidade de coexistência de humanos e animais da megafauna. Em meados do século XIX a teoria aceita consistia na chegada do homem no continente americano em tempos recentes, não ultrapassando 6 mil anos, todavia, segundo a comunidade científica, principalmente européia, não havia a possibilidade de existência de megafauna na América do Sul. Lund através de suas escavações encontrou refugos fósseis de seres humanos e preguiça gigante além de um crânio de cavalo selvagem. Tais descobertas ecoaram em todo o mundo enaltecendo a região de Lagoa Santa como um cenário importantíssimo para desvendar o mistério sobre o povoamento das Américas. Muitos arqueólogos e paleontólogos europeus aventaram a possibilidade de que tais fragmentos ósseos (antrópicos e animais) poderiam de sido colocados in situ por intermédios de erosões naturais e enxurradas, no entanto, Peter Lund percebeu que em ambos fósseis o nível de fossilização era o mesmo, corroborando a sua teoria de contemporaneidade de homens e megafauna na América do Sul. Segundo Walter Neves, Bioantropólogo e Diretor do Centro de Estudos Evolutivos da USP, megafauna são animais que possuem mais de 44 kg. No entanto, a megafauna descoberta no carste de Lagoa Santa consistia em animais enormes, hoje extintos, como por exemplo, preguiça gigante (Eremoterium), tatu gigante (gliptodonte), tigre de dentes de sabre (smilodon) e etc. Essas descobertas são evidências plausíveis que permitiram recuar em mais de 7 mil anos a teoria do povoamento das Américas, a partir de tais achados a teoria anterior precisou ser reformulada em no mínimo 12 mil anos como o possível período de penetração humana no continente americano. Em resumo as descobertas de Peter Lund renderam vários fósseis de megafauna, mais de 250 amostras de esqueletos humanos os quais permitiram compreender como eram realizados os ritos fúnebres e o modo de vida daqueles antepassados. Sem dúvida, foram descobertas importantíssimas para a história da humanidade. Após anos de dedicação e pesquisas na região de Lagoa Santa, Peter Lund retornou a Dinamarca cessando momentaneamente as pesquisas naquela região, que só foram retomadas algumas décadas mais tarde. Um dos aspectos que contribuíram para a paralisação das pesquisas foram o esgotamento dos recursos financeiros e a debilitação da saúde de Lund. Muitos artefatos, ossos e vestígios coletados na região de Lagoa Santa estão no Museu Dinamarquês de Zoologia.

A arqueologia é uma ciência que surgiu na Europa e se espalhou para os demais continentes esporadicamente, sendo assim, a arqueologia só surgiu aqui no Brasil sob a forma de capacitação e mais tarde graduação em meados da década de 1960 através de uma parceria do Governo Francês e Brasileiro, denominada na época de Missão Franco-brasileira. Vários arqueólogos Franceses vieram ao Brasil capacitar os novos arqueólogos, dentre os franceses a arqueóloga Annette Laming Emperaire teve grande influência e destaque no mapeamento de novos sítios arqueológicos brasileiros. Em 1974/75 Annette Laming e sua equipe escavando a gruta Lapa vermelha IV, no município de Pedro Leopoldo, fizeram uma das descobertas mais importantes de toda humanidade, o fóssil de um esqueleto humano, na verdade de uma mulher, que mais tarde foi denominada de Luzia. A descoberta por si só pode soar simples para a comunidade científica, porém, amostras de ossos de Luzia foram enviadas para datação e o resultado “mexeu” com aqueles arqueólogos, Luzia havia morrido há pelo menos 11 mil anos! Além disso, Luzia foi posteriormente analisada por antropólogos especializados na craniometria, mais um choque: Luzia possuía um crânio com as características australo-melanésio, isso significa que Luzia não se parecia em nada com os índios brasileiros atuais, que possuem herança genética e morfológica dos povos mongolóides: chineses, japoneses, esquimós e etc. Luzia se parecia com os povos aborígenes da África e Austrália. Antes da datação e reconstituição da face de Luzia a arqueóloga Annette Emperaire havia falecido após pouco tempo da descoberta, na época foi uma perda lamentável desta intrépida arqueóloga que deu sua contribuição para expansão da arqueologia in loco e no Brasil. Devido a tais descobertas que abalaram toda a comunidade científica mundial Lagoa Santa passou de um mero município Brasileiro, para um epicentro de estudos sobre o povoamento do continente Americano.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Arte rupestre no Brasil pré-histórico

O território que atualmente é conhecido como Brasil, nosso país, abriga uma miríade de sítios arqueológicos com vários registros rupestres. Em praticamente todos os Estados brasileiros existem sítios arqueológicos e, mais especificamente, com artes rupestres. Arte rupestre consiste no registro de abstrações, como por exemplo, idéias, representações simbólicas, rituais, cerimoniais, lúdicas, cenas cotidianas de caça e pesca, coleta de frutos, raízes e tubérculos, cenas de execuções, cópula sexual e etc. sobre um determinado suporte rochoso. Alguns estudiosos do assunto contestam o conceito de “arte rupestre” preferindo o termo registro rupestre, contudo, embora exista tal discussão acadêmica sobre a nomenclatura mais adequada não há como negar o fascínio na execução dessas abstrações. Mas quem foram os autores de tais grafismos (pinturas e gravuras) nos suportes rochosos do nosso país? Já foram publicadas diversas teorias sobre o assunto, algumas inclusive, imprecisas e incoerentes, como as que atribuem a autoria dos grafismos a Egípcios, Fenícios, Gregos, Hebreus, Atlântidas e outros povos do Mediterrâneo e Oriente. Contudo, tais afirmações são questionáveis e facilmente refutadas pela arqueologia. Não há dúvidas sobre os autores dos grafismos no solo brasileiro, nossos ancestrais indígenas. Os índios que habitavam a região conhecida hoje como Brasil já pintavam as paredes de alguns suportes rochosos a mais de 12.000 AP. Todavia, as pesquisas ainda são preliminares e não conclusivas, digamos que os estudos sobre o assunto ainda são incipientes, em outras palavras, tal estudo encontra-se num estágio embrionário, falta muito para se descobrir sobre a verdadeira antiguidade dessa prática autóctone.

Na Europa há mais de 30 mil anos o homem já “decorava” as paredes de algumas cavernas, sobretudo Lascaux, na França e Altamira, na Espanha, entretanto, aqui no Brasil, a Arqueóloga Niéde Guidon, acredita que a prática de registrar nas paredes pode ser mais remota ainda, inclusive Niéde encontrou em São Raimundo Nonato, no Piauí, através de escavações, camadas estratigráficas com parte de painéis caídos contendo pinturas rupestres que foram datadas em 23 mil anos. No entanto, Enquanto na Europa, o homem pré-histórico apreciava representar zoomorfos (animais), aqui no Brasil, a preferência era a representação de antropomorfos (seres humanos), zoomorfos (animais) e fitomorfos (vegetais). As regiões Sudeste, Centro-oeste e Nordeste se destacam pelas grandes concentrações de sítios arqueológicos com muitos registros rupestres. Os Estados de Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás, Tocantins, Bahia, Piauí, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte são conhecidos pela arqueologia por sua variedade de grafismos. A região Amazônica também possui sítios com registros rupestres, todavia, é uma região vastíssima e de difícil acesso devido à floresta densa, sendo assim, as pesquisas ainda são tênues e preliminares.

No litoral brasileiro existem pouquíssimos registros rupestres, isso devido à ausência de suportes rochosos. Os poucos sítios conhecidos são chamados de sambaqui, que na língua Tupi significa amontoado de conchas. As regiões Sudeste, Centro-oeste e Nordeste, interior do nosso país, são bastante conhecidas pelas inúmeras deformidades no relevo e acidentes geográficos, formando cânions, morros, vales, chapadas, matacões, planícies, planaltos, várzeas, cuestas e etc. Esses acidentes geográficos ou geomorfológicos serviam de abrigo para as comunidades nômades indígenas que, ocasionalmente, necessitavam de abrigo para descanso, realizar suas refeições, fabricar utensílios líticos, sepultar seus mortos e moradia. Onde há alguma caverna, furna, lapa, abrigo sob rocha, geralmente se encontra registros rupestres ou vestígios de cultura material de habitações remotas. Isso não é uma regra, mas a maioria das descobertas de sítios arqueológicos pré-históricos com pinturas rupestres são realizadas em cavernas ou abrigos sob rocha, no entanto, tem-se comprovado também que alguns indígenas levantavam acampamentos a céu aberto. O que torna o trabalho do arqueólogo bastante difícil pela exposição dos sítios aos efeitos do intemperismo.

Como os nativos fabricavam tais pigmentos e pintavam as paredes dos abrigos sob rocha? A resposta a esse questionamento varia bastante. O que se sabe até o momento é que os pigmentos eram obtidos de alguns minerais colhidos nos locais ou noutras regiões. A cor vermelha, por exemplo, o mais presente na arte rupestre brasileira era retirado da hematita que é um mineral que contém bastante ferro, este mineral, muitas vezes, era triturado ou dissolvido em água e acrescido de resinas vegetais formando uma pasta na tonalidade vermelha, também os índios usavam o óxido de ferro (conhecido popularmente como ferrugem) aplicando diretamente nos suportes rochosos com o uso dos dedos ou usando galhos e folhas como pincéis. Em alguns casos, esquentava-se o pigmento para obter uma tonalidade mais escura. Nos painéis com pinturas, em alguns sítios, observa-se uma policromia de pigmentos, várias cores utilizadas nas rochas. Brancas, amarelas e pretas são as mais destacadas. O branco e amarelo são obtidos de argilas, porém a cor preta era obtida por ossos queimados (calcinados) e triturados formando um pigmento escuro.

Como os arqueólogos afirmam que os registros rupestres são tão antigos? O que corroboras tais pesquisas? Alguns pigmentos, componentes de uma determinada pintura, podem ser datados através de um exame em laboratório, chamado pela comunidade científica de C-14, carbono 14. Este exame é realizado em laboratórios da França e em outros países. Segundo Walter Neves, um exame de C-14 custa em média $ 1.000 dólares. Tal exame consiste na retirada de um fragmento de matéria orgânica que será analisada em laboratório, concluindo, portanto, a antiguidade daquele determinado fragmento.

As pesquisas sobre a arte rupestre brasileira estão ainda no começo, existem poucas publicações do gênero, sobretudo registros rupestres. Além disso, nossos arqueólogos são poucos, proporcionalmente a dimensão de nosso país. A pesquisa arqueológica é bastante onerosa, faltando muitas vezes, investimento dos setores públicos e privados na consolidação das prospecções (escavações).

A arte rupestre é um documento do nosso passado, consistem na antiguidade de nossos ancestrais, os verdadeiros latifundiários dessas terras. Qualquer painel com pinturas e gravuras rupestres deve ser protegido e preservado. Todavia, o que se observa é um desrespeito enorme com tais registros da nossa história. É com bastante freqüência o uso de vandalismo e predatorismo praticados por pessoas que desconhecem o valor contido nos grafismos. A arte rupestre brasileira deve ser enaltecida como um registro do passado, um alfabeto autóctone que está paulatinamente caindo no esquecimento.

O problema é que o conhecimento sobre a pré-história brasileira e sua arte rupestre vem sendo construído a passo de formiga. A passo gigante, avançam sobre o patrimônio arqueológico as ameaças de destruição”.

(André Prous, Arqueólogo UFMG)