quarta-feira, 9 de junho de 2010

Teorias e controvérsias sobre o povoamento das Américas


Ainda hoje não existe um consenso acerca do povoamento das Américas. Arqueólogos norte-americanos e sul-americanos, há mais de uma década, promovem acirradas contendas sobre diversas teorias de ocupações desse continente. Os grandes centros de estudos arqueológicos da Europa e da América Latina, também se dividem entre os dois lados, havendo uma forte tendência para aceitar as provas apresentadas pelos sul-americanos.
A chegada do homem pelo Estreito de Bering: esta teoria migratória é aceita por todas as academias, que tem como princípio o período da última Glaciação. A questão é o determinismo dos norte-americanos que se apegam somente no modelo Clóvis fist. Por isso, determinam que a ocupação das planícies da América do Norte, por seres humanos, se deu por volta de 11.400 anos BP[1], que foi a datação obtida dos achados do sítio Clóvis. Os norte-americanos acreditam que tal travessia só foi possível em no máximo 20 mil anos atrás. Assim sendo, as ocupações de outra parte da América estariam limitadas por esta data, supondo ser ela a mais antiga do continente.
Os arqueólogos sul-americanos, mesmo aceitando a mesma teoria, têm levantado outras datas bem mais recuadas daquela de 11.400 para a entrada na América por aquele estreito. A partir dos vestígios achados e das datações obtidas em suas pesquisas, estes sustentam que o processo de dispersão dos grupos humanos em direção ao Centro e ao Sul do continente, aconteceu provavelmente em períodos bem mais recuados. Hoje, o intervalo de tempo é bem diferente daquele: se sustenta deste os 48 mil, até 14 mil anos Antes do Presente.
Assim sendo, achamos ser necessário mostrar um pouco o que a literatura sobre o assunto apresenta, através da fala dos pesquisadores que argumentam esta questão, dando suas versões sempre a partir dos resultados de suas pesquisas. Por exemplo, Betty Meggers (1979) acha que os primeiros homens tenham chegado a América há 12.000 ou há 40.000 anos. O fato é que o homem entrou no Novo Mundo enquanto estava, técnica e culturalmente falando, ainda subsistindo à base de plantas e de animais selvagens.
Com a ampliação das pesquisas a arqueóloga Anna Roosevelt (2000) afirma que a cultura mais antiga dos sítios de matança, foi datada por escavação de dez sítios onde foram obtidas datações radiocarbônicas entre 11.200 e 10.900 anos. Estes sítios estão próximos a localidade de Clóvis, no Estado do Novo México, nos Estados Unidos. A cultura daquele grupo foi caracterizada como especializada na caçada a animais de grande porte[2], promovendo ações de caça ordenada e matança generalizada. Outra característica dessa cultura é sua indústria lítica bem elaborada destacando-se as pontas de projéteis com acaneluras. Isto significa que este povo utilizava encabamento de seus projéteis o que facilitava a matança de grandes animais.
Esta hipótese sugere que a colonização do continente foi impulsionada pela questão de sobrevivência. A nossa interpretação sobre as ideias de Meggers, sugere que mesmo sendo o ser humano o único animal capaz de prover objetos à sua sobrevivência, fica difícil entender porque ele correu os riscos de seguir manadas de animais que eram extremamente perigosos de serem caçados? Se pensarmos na rusticidade de suas “armas”. Para reforçar a nossa dúvida, queremos ilustrar com o texto abaixo:

A gama de modelos permitida pela capacidade do cérebro do homo sapiens é tal que parece frustrante continuarmos fechados dentro da solução única de um bando correndo atrás da caça através de toda a Beríngia e do Alasca à Terra do Fogo. (GUIDON, 1992)

Outro embate “científico” é desencadeado pela via de acesso ao continente americano. Os arqueólogos norte-americanos são unânimes e resistentes ao defender que a chegada se deu exclusivamente pelo Estreito de Bering. Existe outra teoria migratória que afirma, que em um período bem mais recente (entre 4 e 2 mil BP), grandes levas humanas chegaram navegando a América Central e do Sul pelo Oceano Pacífico, vindos do extremo oriente. Esta ideia é compartilhada por todos, mas está fora daquela discussão por ter sido há pouco tempo e explica porque dos índios têm forte característica mongólica por serem, de fato, descendentes dos grupos étnicos dos povos orientais. 
Como se explica a passagem para a América pelo Estreito de Bering se geograficamente o estreito é um obstáculo natural? Porque se admite que durante a Glaciação duas situações opostas, do ponto de vista climático estaria ocorrendo: intensas geadas no hemisfério norte onde o gelo ocupava todo estreito, formando uma espécie de “ponte” interligando a Sibéria (Ásia) ao Alasca (América). Para Meggers (1979) a mais antiga “ponte de gelo” existiu entre 50.000 e 40.000 anos atrás e foi usada por várias espécies de mamíferos do Velho Mundo. Se os animais, para fugir do frio buscavam um local mais quente onde pudessem encontrar alimento, caminharam a esmo até alcançar um pouco mais o sul da América do Norte e o homem pode ter acompanhado.
O segundo fenômeno aconteceu nas regiões tropicais da Terra. Pelos choques térmicos entre as camadas atmosféricas havia a evaporação das águas, que tomava o caminho do norte e transformavam-se em nevascas já que a tendência climática da Terra era a queda de temperatura. Tal situação pode ter determinado o rebaixamento dos níveis dos mares que recuaram em mais de 150 metros dos níveis atuais. Cada glaciação durou milhares de anos, de forma que quanto mais água saia dos mares se transformando em grande geleiras, diminua o nível das águas dos oceanos.
Vamos imaginar que as águas estando 150 metros abaixo, a lógica indica que milhares de ilhas, que hoje estão submersas, passaram a existir e formavam uma “trilha natural”, ligando, por exemplo o continente africano e a América do Sul. Por isso, não devemos ver como estranho alguns arqueólogos, em sua maioria, sul-americanos discutindo e sugerindo a possibilidade de travessias por diversas partes, dando acesso ao continente americano em quase toda sua extensão, principalmente nas proximidades do Equador e assim se explicam os achados de vestígios humanos com datações tão antigas no Brasil. As pesquisas arqueológicas na América do Sul têm proporcionado evidências de que a chegada ao continente não se restringe apenas a uma leva humana apenas pelo Estreito de Bering. Provas de tal travessia ainda não foram descobertas ou pode ter sido destruídas e/ou continuam submersas pelo avanço dos mares ao nível atual. 
                          
Ao longo da última glaciação (Wisconsin), a retenção das águas nas grandes geleiras continentais fez baixar o nível global dos oceanos em cerca de 120 metros abaixo do nível atual, deixando emersas amplas superfícies antes submersas. (LIMA, 2006)

Esta hipótese refuta a travessia pela Beríngia como única passagem utilizada pelos primeiros grupos humanos, a ausência de sítios arqueológicos correspondentes a esses primeiros moradores, no leste da Sibéria e no oeste do Canadá, aumenta as dúvidas. Esta ausência de vestígios materiais da travessia por Bering deixa muitos arqueólogos sem dados plausíveis que confirmem uma datação confiável para a passagem. As descobertas arqueológicas até o momento não corroboram a passagem pela Beríngia no período do pleistoceno[3] Os sítios que foram descobertos no leste siberiano e no noroeste canadense foram datados do holoceno,[4] isso significa que pode se tratar de deslocamentos de povos recentes, vindos das bandas do centro dos respectivos continentes.

Contudo, as evidências arqueológicas do lado leste de Beríngia são decepcionantes para os que esperam dela grandes antiguidades. Os registros são pobres, insuficientes, e nem um pouco convincentes no que diz respeito a ocupações anteriores há 12 mil anos. [...] Broken Mammoth, que apresenta evidências consistentes aliadas a datações confiáveis que o posicionam até o momento como a ocupação mais antiga do Alaska, em torno de 11.700 anos antes do presente. [...] Atualmente, os sítios mais antigos a oeste de Beríngia, como Ushki e Berelekh, estão datados entre 14 mil e 11 mil anos antes do presente. (LIMA, 2006).


[1] BP = Before Present, expressão usada a partir de 1950. Encontramos também na versão em português, pela iniciais AP = Antes do Presente.
[2] Segundo Walter Alves Neves, animais de grande porte são aqueles com mais de 44 kg.
[3] É o período correspondente entre 1,8 milhões de anos e mais ou menos há 12 mil anos atrás.
[4] Período correspondente entre 12 mil anos até hoje.


16 comentários:

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  2. - ótimo Blog , assuntos bem escolhidos ..
    Históriador você sim tem História pra Contar .

    - Enteressanto Boa Ocupação de Assuntos ♥
    para a gente xauzão ~

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  3. Obrigado pela visita Andreza, espero mesmo que tenha gostado! Fique acompanhando este blog, pois em breve vou postar mais matérias sobre assuntos variados que interessam a humanidade. Abraços, Chico.

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  4. Este tipo de trabalho postado na internet é muito útil para alunos de ensino médio e superior, na hora fazer trabalhos relacionados a história. parabéns....

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  5. Obrigado pela visita. O segredo deste blog é gostar daquilo que faço, a história. Não considero uma pessoa graduada em história como historiador ou historiados, mas apenas aqueles que se deixam e tentam elucidar a história enquanto ciência. Ser historiador é gostar de história, caso contrário, deve-se escolher outra profissão.

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  6. Queria saber.
    Quais as principais controvérsias que envolvem as teorias sobre a origem do homem americano?

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  7. Queria saber.
    Quais as principais controvérsias que envolvem as teorias sobre a origem do homem americano?

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  8. Queria saber.
    Quais as principais controvérsias que envolvem as teorias sobre a origem do homem americano?

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  9. Olá Jefferson Rodrigues. As maiores controvérsias a respeito das teorias da origem do homem americano se concentram no campo ideológico. Existe um embate enorme entre arqueólogos sul-americanos e norte-americanos de longa data. Os primeiros encontraram sítios arqueológicos com vestígios de presença humana que passam dos 33 mil (Chile) e mais de 50 mil anos (Serra da Capivara, Piauí, Brasil), além disso, estes cientistas defendem que a América foi povoada por diversas rotas: estreito de Bering, navegação de cabotagem, navegação transpacífica e etc., contudo, os norte-americanos não levam em consideração o resultado dessas pesquisas, são relutantes em aceitar estes dados, ele (EUA) aceitam a hipótese de povoamento pelo estreito de bering entre 20 mil anos atrás, qualquer datação mais remota insinuam erros de pesquisa ou dizem que as amostras foram contaminadas. É um debate de ordem ideológica, apesar de que, muitos norte-americanos estão revendo suas pesquisas.

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  10. Oi Francisco! Estou no sexto ano e gostaria de saber se essas teorias tem um nome, ex, a teoria do estreito de bering.

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  11. Este comentário foi removido pelo autor.

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  12. Olá Vitória. Os nomes são aqueles mesmos que você ler habitualmente, mas a maioria dessas teorias são nomes como o da Beríngia, rotas transpacíficas, povoamento das Américas por meio de navegação de cabotagem, levas advindas da Polinésia e etc.
    Obrigado por participar.

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  13. Adorei o conteúdo, bastante enriquecedor para minha aula, parabéns.

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  14. conteudo enriquecedor, estou pesquisando este assunto com minha filha e aprendendo cada vez mais.

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  15. A história do povoamento da América por comunidades pré-históricas é uma discussão rica e polêmica. Há muita coisa ainda por se descobrir. Obrigado por enriquecer o diálogo.

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