terça-feira, 11 de setembro de 2012

Despolitização nas redes sociais


            Alguns sociólogos chamam o mundo globalizado de Aldeia Global, estamos todos conectados por uma enorme rede mundial de computadores, a internet e uma de suas afilhadas, as redes sociais, são os links mais acessados da atualidade, sobretudo, o facebook. Estima-se que esta rede social já alcançou os assombrosos números de meio bilhão de usuários, além disso, as ações do facebook atingiram o pico de 100 bilhões de dólares. Recentemente a Revista Veja publicou uma pesquisa cujo revelou a média mensal que os brasileiros acessam as redes sociais, oito horas, somos o quinto país do mundo no rank divulgado pela revista. Quem antes tinha perfil no Orkut, rede social da gigantesca Google, migrou para o facebook, inclusive, diante da perda de usuários o Google criou uma nova rede social, a Google+. Entretanto, vamos direto ao ponto. Mais especificamente, tratarei de discutir aqui as atitudes de alguns usuários do facebook e seus posicionamentos políticos ou inversamente, sua ausência de postura política correta.
            Tenho observado no facebook uma série de comentários ofensivos, agressivos, indecentes e detratores de cunho apolítico. Milhares de pessoas postam diariamente ofensas, ameaças e comentários carregados de ódio, rancor e indiferença pelo outro. Sentimentos de empatia, alteridade, complacência e tolerância são escassos e intermitentes na rede. Quais as razões de tanta intolerância? Por que isso ocorre justamente agora? O objetivo de uma rede social é o compartilhamento de textos, fotos, vídeos e mensagens pacíficas e, principalmente, abocanhar lucros, entendo dessa forma, até porque, não seria sábio por parte de seus idealizadores a criação de uma rede de intrigas e de ódio, a sociedade já possui esses problemas em grande quantidade. O mais surpreendente disso tudo é perceber que os comentários maldosos e injuriosos partem de pessoas que pregam a paz e o amor. Religiosos, educadores, servidores públicos, estudantes de Direito, pseudo jornalistas e outras categorias, infestam a rede social com ódio e desamor ao próximo. E as trocas de mensagens carregadas de maledicências são mútuas. Existem, inclusive, perfis falsos cuja criação foi premeditada para ofender pessoas específicas de um determinado partido político. O que mais intriga é a sensação de impunidade que impera nesta rede social, acredito, que os agressores só fazem isso pela convicção de impunidade, pois, são escassos e raríssimos os casos que incorreram em pena neste país.
            A Constituição Federal de 1988, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e demais legislações vigentes defendem a liberdade de expressão, de culto, de orientação sexual e o direito democrático, porém, nas redes sociais, principalmente, no facebook impera a inobservância destes fundamentos cruciais para a manutenção da ordem e da paz. Ninguém tem o direito de repudiar, rechaçar nem desprezar as opções e escolhas subjetivas das pessoas, temos a liberdade de escolher em quem votar, o que comer, o que fazer, aonde ir, entretanto, ninguém tem a autonomia de tolher as opções de outrem nem emitir comentários dogmáticos e inflamados de iras. O facebook virou uma rede social do ódio, desamor e intolerância, veem-se muitos risos, deboches e textos irônicos em relação às escolhas e opções subjetivas dos outros. Os estudantes, ultimamente, tem-se ocupado em ofender e tecer comentários indecentes, inconcebíveis e indecorosos aos indivíduos com posicionamentos diferentes aos seus e, não para por ai, vi com surpresa comentários de pessoas ligadas a educação (Profissionais em Educação) ofendendo ao próximo por meio de textos com teor irônicos e mentecaptos com palavras indecentes que não cabe aqui cita-las. O que interessa aqui é tentar buscar uma explicação filosófica ou científica para tais ações indesejáveis, por que tantas pessoas passam horas a fio defendendo pessoas que quando eleitas não são fiscalizadas e nem tampouco avaliadas conforme uma atitude arrazoada? São questões difíceis de responder de imediato, existe a necessidade de uma investigação filosófica maior para alcançar ou se aproximar do cerne ou raiz desses problemas.
            Acredito e tenho quase convicção de que tais ações são realizadas pelo sentimento de impunidade que impera neste país, nosso código penal está desatualizado e em virtude disso ainda inexistem no interior, delegacias especializadas em crimes ocorridos pela internet. Em algumas capitais brasileiras existem delegacias especializadas, assim como a delegacia da mulher, porém, no interior não temos postos específicos. Um caso raro de pena e que deveria servir de exemplo foi da estudante de Direito Mayara Petruso que através de outra rede social, o twitter, ofendeu e teceu inúmeros comentários preconceituosos e discriminatórios contra os nordestinos, a estudante foi condenada a quase um ano e meio de detenção – infelizmente a condenação foi revertida para pena alternativa e pagamento de uma simples multa de R$ 500,00. Isso alimenta ainda mais o sentimento de impunidade neste país. Muitos internautas pensam que não podem ser penalizados por suas posturas politicamente incorretas no facebook, inclusive, aqueles que criaram fakes – perfis falsos – para ofender desenfreadamente os outros, entretanto, cada computador possui um IP, que é uma assinatura digital, o IP possibilita a polícia militar, civil e federal rastrear e localizar o computador que produziu tais comentários inoportunos e discriminatórios ferindo a legislação vigente. Além disso, qualquer pessoa que sentir lesada, desrespeitada e aviltada por comentários de outrem podem procurar uma delegacia mais próxima e registrar queixa, basta para isso, copiar e salvar as mensagens e imagens dos agressores no facebook, se todos tivessem um comportamento parecido, quiçá, seriamos respeitados enquanto seres humanos portadores de culturas e, dentro de uma sociedade não existe uma cultura homogênea, mas uma pluralidade cultural.
            Talvez, outra razão da emissão de inúmeros comentários ofensivos se deva a temerosidade e preocupações subjetivas de alguns eleitores cujos interesses pessoais estão acima de tudo, até mesmo dos bons costumes. Quem deseja manter seus empregos faz com maior intensidade xingamentos e maus-tratos ao opositor, assim também como, pessoas que ocupam cargos de confiança desejam a manutenção de certas regalias e privilégios, então neste caso, deixa-se de lado a conduta ética e moral de lado em nome da promoção e infestação de rancor, ódio e a arte da intolerância. Destarte, Frei Betto (2012) – grande teólogo e pensador brasileiro faz o seguinte comentário sobre as redes sociais:

Quem tem nojo de política é governado por quem não tem. E os maus políticos torcem para que tenhamos todos bastante nojo de política. Assim, eles ficam em paz, entretidos em embolsar o nosso dinheiro e ampliar suas mordomias e seus patrimônios. [...] As redes sociais são, hoje, o que a ágora era para os gregos antigos e a praça para os nossos avós – local de congraçamento, informação e mobilização. [...] As redes sociais têm, entretanto, seu lado obscuro e perverso: [...] o incitamento à violência. (grifo nosso)

            Creio que o ódio e os comentários inexpressivos de algumas pessoas contaminam quem gosta de política e da vida pública. Basta para isso usar um pouco de lógica: se alguém lhe ofender através do facebook, não há nenhuma necessidade de resposta, pois baixaria não se combate com baixaria, mas com silêncio. O silêncio é mais virtude – neste caso – do que a baixaria e incitamento à violência. Não podemos combater irracionalidade com mais irracionalidade, enfrenta-se a irracionalidade com a racionalidade, com a razão. Se alguém lhe ofende por meio do facebook basta apenas e, tão somente, excluí-lo (a) de sua rede de amizades, simples. O verdadeiro amigo não xinga, não desrespeita, não agride, pelo contrário, congraça, respeita, tolera e se orgulha da sua presença, mesma a virtual. O dramaturgo e cronista Nelson Rodrigues já alertava: toda unanimidade é burra. Quem pensa como a unanimidade não precisa pensar.
            Ainda seguindo as ideias de Frei Betto (2012) devemos nos agarrar e propor a semeadura da Arte da Tolerância, o que isso significa? Tolerância é a capacidade de aceitar o diferente. Não confundir com o divergente. Intolerância é não suportar a pluralidade de opiniões e posições, crenças e ideias, como se a verdade fizesse morada em mim e todos devessem buscar a luz sob o meu teto. No facebook a arte da intolerância predomina, não preciso enfatizar mais, contudo, para eliminar esses dissabores é necessário enxergamos o outro como outro e não com as lentes de nossas opiniões, que no mais das vezes, se traduz em intolerância. Vamos substituir a intolerância pela tolerância e para que isso aconteça é fundamental o aprofundamento da crença de pluralidade cultural, somos diferentes culturalmente, sendo assim, temos conceitos, crenças e atitudes diversas, não há uma homogeneidade política, mas o inverso. Os interesses pessoais e particulares devem ser substituídos pelos interesses que atendam as perspectivas da cidade, da coletividade, do grupo.
Portanto, esses comportamentos insidiosos devem ser substituídos pela disseminação da democratização, da cultura de paz, do amor ao próximo, mesmo que divergente, respeitar e ser respeitado em sua integridade e identidade social, se essas ações forem bem encaminhadas, decerto estaremos no rumo da humanização de fato. Ao invés de promover comportamentos irascíveis, vamos propor uma luta pela paz, pelo respeito ao próximo, por mais saúde, por uma educação pública de qualidade, de preservação do ambiente, de saneamento básico para todos, de infraestrutura adequadas as demandas sociais, de transporte, de moradia e coisas congêneres. Perder tempo tecendo comentários irrefletidos não leva a lugar algum, vamos usar a nossa maior ferramenta promovida pela seleção natural, a consciência, a capacidade de se autoavaliar, a razão, a nossa sabedoria construindo coisas saudáveis, boas e agradáveis. Devemos, antes de tudo, formar seres politizados, cônscios de suas ações e pessoas capazes de avaliar com criticidade a realidade na qual está inserido. Para encerrar, cabe aqui a visão crítica de Nelson Rodrigues sobre a intolerância no Brasil: O que atrapalha o brasileiro é o próprio brasileiro. Que Brasil formidável seria o Brasil se o brasileiro gostasse do brasileiro.