quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Regresso ao sítio arqueológico gaiola

Alunos do 3º Estudos Gerais A.
No último sábado, 18/09, retornei ao sítio arqueológico gaiola, zona rural do município de Ibirajuba, acompanhado por oito alunos do 3º Estudos Gerais – turma A – da Escola Estadual Corsina Braga, município de Cachoeirinha. Nossa expedição tinha como meta principal colher novas informações e dados arqueológicos pertinentes à cultura material da etnia indígena que habitou aquela região num passado longínquo. Saímos cedo, percorremos a trilha pedregosa, íngreme e acidentada que dá acesso ao sítio gaiola. Foi uma caminhada de pouco mais de 40 minutos sob um clima instável, ensolarado e às vezes nublado. Regressei ao sítio após quatro meses na intenção de encontrar alguns artefatos líticos, avaliar o sítio, as gravuras rupestres e o seu entorno após a estação chuvosa que neste ano foi mais duradoura do que o habitual, na tentativa de aventar como era a vida cotidiana daquele povo e sua luta pela sobrevivência sob tais circunstâncias naturais.
Uma das cachoeiras do rio gaiola.

            Constatamos que o enorme lajedo onde se localizam as gravuras rupestres que em arqueologia são denominadas de itaquatiaras, pedra talhada ou lavrada na língua tupi, sofreram depredações e atos de vandalismo. É preciso ressaltar que a localização geográfica do mencionado sítio arqueológico é inacessível e possui poucas residências nas suas imediações, contudo, mesmo assim o vândalo que promoveu tais incisões na rocha sabia de forma deliberada o que estava fazendo. Foram cunhadas duas cruzes próximas às gravuras de braços humanos que ali foram lapidadas há provavelmente – no mínimo – um milênio atrás. Utilizamos esta estimativa mediante a comparação com outros sítios arqueológicos da região e que foram feitos sob a mesma técnica na produção dos registros rupestres. O(s) indivíduo(s) que produziu o vandalismo usou a técnica da percussão, através do picoteamento fazendo cruzes que talvez fazem alusão ao símbolo do Cristianismo. Existe uma Lei Federal de 1962 onde determina que qualquer prática de vandalismo, destruição e obstrução de sítios arqueológicos, os responsáveis devem sofrer detenção de no mínimo seis meses. Infelizmente o vandalismo no sítio arqueológico gaiola é fato. É lamentável que existam pessoas que não sabem do conceito de Patrimônio arqueológico e tampouco sabem que os registros rupestres – arte rupestre – são vestígios da cultura material e, sobretudo, imaterial de nossos antepassados diretos.
Note-se ao lado dos dedos humanos , vândalos talharam uma cruz.
Outra evidência de vandalismo. Cruz cunhada sobre uma gravura rupestre pré-histórica.


            O sítio arqueológico gaiola possui esta nomenclatura devido a sua localização ser dentro de um curso d’água homônimo. Imaginávamos que o sítio era na verdade um arroio, um rio que secou a bastante tempo preservando apenas o seu curso antanho, porém, no dia que o visitamos, o rio estava ativo e fluindo muita água das chuvas que caíram na região há três meses. Há um local no lajedo que o rio forma um declive muito acentuado promovendo uma queda livre d’água, formando uma cachoeira natural. Esse cenário na pré-história dali favorecia a obtenção de uma alimentação regada a muitos peixes. Mais adiante ao local da queda livre d’água forma-se um reservatório natural de água, um caldeirão d’água que dura – mesmo em períodos de estiagem – alguns meses. Não há dúvidas de que a localidade é propensa à obtenção de alimentos, sobretudo, animais que eram ali caçados no momento que buscavam água para saciar sua sede. Os homens caçadores ficavam à espreita aguardando o momento exato em que os animais buscavam água para capturá-los e alimentar-se deles posteriormente.
Grafismos puros.

            Próximo ao painel principal, local no qual existe a maior quantidade registros rupestres há outro suporte rochoso que fica a menos de cinco metros de distância deste suporte. Nele existem alguns grafismos puros – denominação que segundo a Arqueóloga Anne Marie-Pessis (UFPE e Fundação Museu do Homem Americano) consiste nos grafismos rupestres que não podemos definir o que eram e o que representavam em sua essência aos povos que a confeccionaram – estão bem desgastados possivelmente pela ação do vento, sol e correnteza. Os grafismos rupestres parecem com plantas cactáceas como o mandacaru que é abundante naquela região. Utilizamos essa comparação analisando-se as silhuetas e formas dos registros rupestres deste suporte, além disso, é muito comum na pré-história os povos que ali viveram representar vegetais, plantas e animais da região.
Grafismo puros que possuem a forma, quiçá, de plantas cactáceas.

            Notamos também que o paredão principal – o suporte rochoso – onde se localizam as gravuras rupestres sofre um adiantado processo de erosão ocasionado pelo próprio rio gaiola, pela insolação, vento e agora pelo ser humano. O suporte está sofrendo desplacamento e descamação de algumas partes do bloco rochoso – inclusive – observamos um enorme bloco de provavelmente cinco metros de comprimento que se desprendeu da rocha original. Algumas gravuras já se perderam para sempre, talvez foram levadas pelas correntezas ou caíram naturalmente. O que se sabe é que uma pesquisa urgente é necessária antes que a própria natureza e agora o ser humano acabem com mais um patrimônio da humanidade.
            Após picadas de maribondo, caminhada extenuante, escalada em várias rochas, análise e procura de novos registros rupestres concluímos nossas pesquisas nos deliciando nas águas gélidas do rio gaiola. 

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